-“Há algum tempo eu era jurado. O Tribunal devia julgar um moço, apenas
saído da adolescência, acusado de ter assassinado uma senhora idosa em
circunstâncias horríveis. O acusado confessava e contava os detalhes do crime
com uma impassibilidade e cinismo que faziam fremir a assembleia”. Assim escreveu em carta à REVISTA ESPÍRITA, um correspondente identificado
como Simon
M. e apresentado por Allan Kardec como homem de grande
saber, portador de títulos científicos oficiais e bom médium acostumado a contatos
com Espíritos desencarnados. O artigo elaborado em torno da missiva que o
destinatário acreditava que o editor “talvez julgasse acertado agasalhar na sua
interessante publicação pelo fato que encerrava”. Assim acabou acontecendo
no número de novembro de 1859. Prosseguindo sua narrativa, Simon
conta: -“É fácil prever que, devido à sua idade, sua absoluta falta de educação e
às influências que havia recebido em família, que se requeresse em seu favor,
circunstâncias atenuantes, tanto mais quanto ele repelia a cólera que o tinha
feito agir contra uma provocação por injurias”, previsão que acabaria
se confirmando na decisão final do júri, afastando o risco da condenação à
morte do rapaz. Simon, todavia, quis consultar a vítima a respeito do grau de
sua culpabilidade, evocando mentalmente o Espírito da senhora morta. Percebendo
sua presença, “abandonou-lhe a mão”, seguindo-se interessante diálogo que
resumiremos da seguinte forma: 1- Indagada sobre o que pensava do assassino, disse que não seria ela quem
o acusaria; 2- Sobre o “porque”,
explicou ter sido o moço impulsionado ao crime pelo Espírito de um homem que a cortejara 50 anos antes e que, nada tendo
conseguido, jurou vingar-se, conservando após a própria morte seu desejo de
vingança, aproveitando das disposições do acusado para lhe inspirar o desejo de
a matar; 3- Questionada sobre como sabia, revelou que o
próprio Espírito obsessor lhe confessara quando de sua chegada ao Plano
Espiritual que ora habitava; 4- Perguntada se o poder exercido pelo obsessor sobre o rapaz teria logrado
sucesso se o mesmo não tivesse nutrido ou entretido durante muito tempo
sentimentos de inveja, ódio e vingança contra ela e sua família, respondeu: -“Seguramente.
Sem isto ele teria sido mais capaz de resistir. Eis por que digo que aquele que
quis se vingar aproveitou as disposições do jovem. O senhor compreende bem que
o outro não se teria dirigido a alguém que tivesse vontade de resistir”.
5- Se o mentor gozava de sua vingança, afirmou que não, pois vê que esta
lhe custará caro; além disso, em lugar de lhe fazer mal, fez um bem, fazendo-a
entrar mais cedo no Mundo dos Espíritos, onde era mais feliz, constituindo-se a
violência numa “ação má sem proveito para ele". Finalizando sua carta,
acrescenta Simon: -“A respeito do que acabo de contar, há de
fazer-se uma observação moral de subida importância. Realmente, daí há de
concluir-se que o homem deve vigiar os seus menores pensamentos maus, até os seus
maus sentimentos, aparentemente os mais fugidios, pois estes tem a propriedade
de atrair Espíritos maus e viciados, expondo-se, fraco e desarmado, às suas
inspirações perturbadoras. É uma porta que lhe abre ao mal, sem lhe compreender
o perigo”. O comentário e o relato de Simon M., confirmam a resposta dada a Allan Kardec à pergunta
459 d’O LIVRO DOS ESPÍRITOS, em que
procurava saber se os Espíritos influem sobre nossos pensamentos e nossas
ações, obtendo a revelação: -“Nesse sentido a sua influência é maior do
que supondes, porque muito frequentemente são eles que vos dirigem”. Observando-se
o comportamento social do homem, extravasando de forma cada vez mais coletiva, sem
limites, suas tendências instintivas e sensoriais, encontra-se a explicação dos
crescentes índices de violência gratuita contra si mesmo e contra o próximo, encarado como um inimigo a ser eliminado em nome da inveja, do ciúme, do
despeito. Quanto mais distante da espiritualidade, mais o conceito de
humanidade vai regredindo na direção da animalidade agressiva e destrutiva, não
em nome da sobrevivência, mas, da supremacia de uns sobre os outros. Sem a
educação moral, fruto da árvore do conhecimento, fica a pergunta: qual o futuro
do gênero humano?
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