No número de março
de 1859 da REVISTA ESPÍRITA, Allan Kardec procura esclarecer dúvida
levantada por correspondente da publicação em torno de questão moral, cuja
resposta pode nos auxiliar a entender como surgem no organismo social, de vez em
quando, casos de indivíduos canibais, outros, dados ao esquartejamento ou
decapitação do corpo dos seus semelhantes, outros ainda a ocupações como
açougueiros nos matadouros ou carrascos que executam as sentenças de morte
deliberadas pelos critérios da justiça ou da religião, como se vê ainda em
alguns países ou regiões da Terra. Contrariamente
à ideia genérica do Espírito escolher voluntariamente suas mais marcantes
experiências e provas futuras, o bom senso diz que essa possibilidade apenas contempla
aqueles que já atingiram certo estagio evolutivo. A maioria retorna às lides da
nossa Dimensão submetidos à inflexibilidade da Lei de Causa e Efeito, ou seja,
do Determinismo capaz de impor ao infrator da citada Lei as repercussões das
suas ações, induzindo seu progresso na escala evolutiva. Acompanhemos o
raciocínio de Kardec: -“É evidente, que um Espírito já adiantado, como, por exemplo,
o de um europeu esclarecido, não poderá escolher como via de progresso uma
existência selvagem: em vez de avançar, retrogradaria. Sabem, entretanto, que
os próprios antropófagos não se encontram no último degrau da escala e que há
mundos onde o embrutecimento e a ferocidade não tem analogia na Terra. Esses
Espíritos são ainda inferiores aos mais atrasados do vosso mundo. Vir, pois,
entre os nossos selvagens é-lhes um progresso. Se não visam um ponto muito
alto, é que sua inferioridade moral lhes não permite compreender um progresso
mais completo. Só gradativamente pode o Espírito progredir: deve passar
sucessivamente por todos os graus, de modo que cada passo à frente seja uma
base para assentar um novo progresso. Ele não pode transpor de um salto a
distância que separa o barbárie da civilização, assim como o estudante não transporá,
sem transições, do A B C à retórica. É nisto que vemos uma das necessidades da
reencarnação, que é realmente segundo a justiça de Deus. De outro modo, que
seria desses milhões de seres que morrem no último estado de depravação, se não
tivessem meios de atingir à superioridade? Porque os teria Deus deserdado dos
favores concedidos aos outros homens? Repetimo-lo, por ser ponto essencial: à
vista de sua curta inteligência, só compreendem o que é melhor do seu ponto de
vista e em estreitos limites. Há, entretanto, alguns que se transviam, por quererem subir muito alto e que nos dão o triste
espetáculo da ferocidade no meio da civilização. Voltando ao meio dos canibais,
estes ainda lucrarão. Estas considerações também se aplicam às profissões. Elas
oferecem evidente superioridade relativa para certos Espíritos, e é neste
sentido que devemos conceber a escolha por eles feita. Na mesma posição, elas
podem ser escolhidas como expiação ou como missão, porque nenhuma existe na
qual se não possa fazer o Bem e progredir pela própria maneira de as exercer.
Quanto a saber o que seria dessas profissões caso nenhum Espírito as quisesse
exercer, está respondida pelo fato. Desde que os Espíritos que as alimentam vem
mais de baixo, não é para temer o desemprego. Quando o progresso social
permitir a supressão do ofício de carrasco, desaparecerá o lugar, mas não os
candidatos: estes irão apresentar-se entre povos, ou, entre outros mundos menos
adiantados”. Como esclarece mensagem
reproduzida no capítulo 3 d’O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO, “não são
todos os Espíritos encarnados na Terra que se encontram em expiação(...). Os
Espíritos em expiação aí estão, se assim nos podemos exprimir, como
estrangeiros. Já viveram em outros mundos, dos quais foram excluídos por sua
obstinação no mal, que os tornava causa de perturbação para os bons. Foram
relegados por algum tempo, entre os Espíritos mais atrasados, tendo por missão
faze-los avançar, porque trazem uma inteligência desenvolvida e os germes dos
conhecimentos adquiridos. É por isso que os Espíritos punidos se encontram
entre as raças mais inteligentes, pois são estas também as que sofrem mais
amargamente as misérias da vida, por possuírem maior sensibilidade e serem mais
atingidas pelos atritos do que as raças primitivas, cujo senso moral é mais
obtuso”.
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