A má fé, aliada à ignorância, costuma associar mediunidade e Espiritismo, quando, na verdade, o segundo
somente cumpriu o importante papel de tirar a primeira da aura de mistério e
misticismo, explicando e definindo-a como inerente ao Ser humano,
por ser uma percepção orgânica. Está por trás de inúmeros fenômenos envolvendo a
criatura humana, sua história individual e coletiva, suas venturas e
desventuras, seu equilíbrio e desequilíbrio mento-emocional. E, vez ou outra,
entra no foco dos noticiários através de vítimas de desencarnados a serviço da
perturbação, na tentativa de desfigurar a verdade dos fatos, alimentando a
descrença já tão combalida da espécie humana. Imaginam aqueles que lhes prestam atenção que os Espíritos nada mais são que pessoas como nós, sem o
revestimento do corpo físico, que, como enfatiza o Espiritismo, não alcançaram
níveis de evolução e elevação espiritual compatíveis com as características
que demonstravam na sua forma de ser enquanto encarnados. Recentemente, alguns
órgãos de comunicação de massa divulgaram a “assustadora” e “ridicularizante”
notícia de que importante companhia aérea em operação no Brasil mudou
provisoriamente o número de um de seus voos regulares ante a previsão
registrada em cartório de um acidente aéreo que deveria se dar em área de
grande concentração de edifícios altos, precisando local e dia exatos em que
se daria, resultando, naturalmente, em centenas de mortes e elevados prejuízos. Os que se
contentam com os conhecimentos relativos que já possuem, presos à chamada “zona
de conforto”, como inúmeros outros em situações similares, se valeram
da “frustrante” não consumação da tragédia para ironizar, justificando seu
descrédito em relação à mediunidade. Desconhecem, por exemplo, que n’ O LIVRO DOS MÉDIUNS, questão 10 do item
289, Allan
Kardec reproduz o esclarecimento dos que o auxiliaram a compor a
importante obra, que "os Espíritos que anunciam acontecimentos que não se
realizam, fazem-no, as mais das vezes, para se divertirem com a credulidade, o
terror ou a alegria que provocam; depois, riem-se do desapontamento. Essas
predições mentirosas trazem, no entanto, algumas vezes, um fim sério, qual o de
por à prova aquele a quem são feitas, mediante uma apreciação da maneira por
que toma o que lhe é dito e dos sentimentos bons ou maus que isso lhe desperta”.
Como, por exemplo, a exaltação da vaidade ou ambição. Quatro anos depois, na
REVISTA ESPÍRITA, de julho
de 1865, Allan Kardec se serve de artigo veiculado um mês antes no Grand
Journal , assinado por respeitado articulista, no qual de forma irônica o mesmo relata fato envolvendo amigo pessoal que, aproveitando-se de visita a um médium,
perguntou se ele poderia designar o vencedor das corridas de Chantilly, obtendo
através da evocação de um dos mais célebres desportistas franceses, pelas batidas a designação de letras, formando o nome Gontran. Coincidentemente
havia um cavalo com inscrito no Derby corrido naquele dia chamado Gontran,
que acabou vencedor da prova. Argumenta Allan Kardec que o fato, raro, se
levado em consideração e divulgado para um maior número de pessoas, atrairia
multidões consultando médiuns, transformados em ledores de sorte, dando razão
aos que contra eles invocam a lei de Moisés, que diz respeito a reprovação enérgica “aos
adivinhos, encantadores e os que tem o espírito de Piton”. Acrescenta
aos seus comentários que “o Espiritismo não está destinado a fazer
conhecer; os Espíritos vem para nos tornar melhores e não para nos revelar ou
nos indicar os meios de ganhar dinheiro na ‘certa’ e sem correr perigo
como diz o herói da aventura, ou se ocupar dos nossos interesses materiais,
colocados pela Providência sob a salvaguarda de nossa inteligência, de nossa
prudência, de nossa razão e de nossa atividade.(...). Eis o que todos os
Espíritas sérios devem esforçar-se em propagar, se quiserem servir utilmente à
causa. Temos dito sempre aos que sonharam fortunas colossais com o concurso dos
Espíritos, sob o especioso pretexto que a sensação que um tal acontecimento
produziria, tornaria todo mundo crente quando, se tivessem êxito, desfeririam
um golpe funesto na Doutrina, excitando a cupidez em vez do amor ao Bem. É por
isto que as tentativas desse gênero, encorajadas por Espíritos mistificadores,
sempre foram seguidas de decepções”. No caso do cavalo vencedor, “deve
ser aceito como fato isolado, sendo – diz Kardec -, louco
e imprudente quem se fiasse em sua realização”. O “pequeno fato tinha uma
utilidade: era um meio, talvez o único, para chamar a atenção de certas pessoas
para a ideia dos Espíritos e sua intervenção no mundo”, acrescenta em
suas ponderações.
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