A ideia dos anjos rebeldes, anjos
decaídos, paraíso perdido, se acha em quase todas as religiões e na tradição de
quase todos os povos. As gerações
atuais tomam conhecimento da existência dessa tese através do cinema que em
ficções produzidas nas últimas décadas a expõem fazendo supor algo atual ou
apenas fantasia de escritores, produtores, diretores e roteiristas. O
Espiritismo, através de Allan Kardec apresenta sua visão em
ensaio incluído na edição de janeiro de 1862 da REVISTA ESPÍRITA. Segundo o texto, pelo
fato de ser considerado por tantas escolas filosófico-religiosas, “deve
assentar-se numa verdade”. Acrescenta que “para compreender o verdadeiro
sentido que deve ser ligado à qualificação de anjos rebeldes, não é
necessário supor uma luta real entre Deus e os anjos ou Espíritos, de vez que o
vocábulo anjo aqui é tomado numa acepção geral. Admitindo-se que os homens
sejam Espíritos encarnados, que são os materialistas e os ateus senão anjos ou
Espíritos em revolta contra a Divindade, pois que negam a sua existência e nem
reconhecem seu poder nem suas leis? Não é por orgulho que pretendem que tudo
aquilo de que são capazes vem deles próprios e não de Deus? Não são muito
culpados os que se servem da inteligência, de que se vangloriam, para arrastar
seus semelhantes para o precipício da incredulidade? Até certo ponto não
praticam um ato de revolta aqueles que, sem negar a Divindade, desconhecem os
verdadeiros atributos de sua essência? Os que se cobrem com a máscara da
piedade para o cometimento de ações más? Aqueles cuja fé no futuro não os
desliga dos bens deste mundo? Os que em nome de um Deus de paz violentam a
primeira de suas leis: a lei da caridade? Os que semeiam a perturbação e o ódio
pela calúnia e pela maledicência? Enfim aquele cuja vida voluntariamente
inútil, se escoa na inatividade, sem proveito para si próprio nem para os seus
semelhantes? A todos serão pedidas contas, não só do mal que tiverem feito, mas
do Bem que tiverem deixado de fazer. Ora, todos esses Espíritos que empregaram
tão mal suas encarnações, uma vez excluídos da Terra e enviados a mundos
inferiores, entre populações ainda na infância da barbárie, que serão senão anjos
decaídos, remetidos à expiação? Não
será para eles a Terra que deixam um paraíso perdido, em comparação com o meio
ingrato onde ficarão relegados durante milhares de séculos, até o dia em que
tiverem merecido a libertação”?.
Demonstrando a lógica de seu argumento, Allan Kardec escreve: -“Remontando
à origem da raça atual na pessoa de Adão, encontraremos todos os caracteres de
uma geração de Espíritos expulsos de outro mundo e exilados, por causas
semelhantes na Terra já povoada, mas por homens primitivos, mergulhados na
ignorância e na barbárie e que aqueles tinham por missão fazê-los progredir,
trazendo para o seu meio as luzes de uma inteligência já desenvolvida. Não é,
realmente, o papel até aqui representado pela raça adâmica? Relegando-a para
esta Terra de trabalho e de sofrimento, não teria Deus razão para dizer: ‘tu
comerás o teu pão do suor do teu rosto’? Se ela mereceu tal castigo por
causas semelhantes às que vemos hoje, não será justo dizer que se perdeu pelo
orgulho? Na sua mansuetude não lhe poderia iluminar o caminho a seguir para
alcançar a felicidade dos eleitos? Este Salvador foi enviado na pessoa do
Cristo, que ensinou a lei do amor e da caridade, como verdadeira âncora de
salvação. Aqui se apresenta uma consideração importante. A missão do Cristo é
facilmente compreendida admitindo-se que são os próprios Espíritos que viveram
antes e depois de sua vinda, e que, assim, puderam aproveitar-se de seu ensino,
ou do mérito de seu sacrifício; mas já é mais difícil de compreender, sem a
reencarnação, a utilidade desse mesmo sacrifício para os Espíritos criados
posteriormente à sua vinda e que, assim, Deus os teria criado manchados por
faltas daqueles com os quais não tinham qualquer relação. Esta raça de
Espíritos parece ter completado o seu tempo na Terra. De um modo geral, uns
aproveitaram o tempo e progrediram, com o que mereceram recompensa; outros, por
sua obstinação em fechar os olhos à luz, esgotaram a mansuetude do Criador mereceram castigo. Assim, será a palavra do
Cristo: ‘Os bons ficarão à minha direita e os maus à minha esquerda”.
Kardec
conjectura ainda: -“Os que escreveram a história da antropologia terrestre apegaram-se,
sobretudo, aos caracteres físicos; o elemento espiritual foi quase sempre
negligenciado e o é em regra pelos escritores que nada admitem fora da matéria.
Quando este for levado em conta no estudo das ciências, lançará uma nova luz
sobre uma porção de problemas ainda obscuros, porque o elemento espiritual é
uma das forças vivas da natureza, que desempenha um papel preponderante nos
fenômenos físicos, tanto quanto nos fenômenos morais”.
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