Abrindo o número de outubro
de 1864 da REVISTA ESPÍRITA,
Allan
Kardec apresenta um artigo sugestivo: O Sexto Sentido e a Visão Espiritual.
Para ilustrar seu ponto de vista, expõe uma experiência vivida quando em visita
à casa de um membro identificado apenas como senhor W. da Sociedade
Espírita de Paris, na cidade de Berna, na Suíça, onde ouviu falar e
depois conheceu um camponês das cercanias, possuidor da faculdade de descobrir
fontes e ver num copo respostas às perguntas que lhe faziam. Casado, pai de
família, 64 anos, alto, esguio, boa saúde, torneiro de profissão, protestante,
muito religioso, leitor habitual da Bíblia, vítima desde trinta anos antes de
uma doença que o fazia se movimentar com dificuldade. Segundo relato do senhor W. existindo em sua
propriedade um conduto de águas muito extenso que, por força de certas causas
locais, concluíram que a tomada d’agua fosse mais próxima, para evitar
escavações inúteis, recorreu ao descobridor de fontes. Este, sem deixar seu
quarto, disse olhando o copo: -“No percurso dos tubos existe outra fonte;
está a tantos pés de profundidade, abaixo do décimo quarto tubo, a partir de
tal ponto”. A coisa foi encontrada tal como ele havia indicado.
Aproveitando a ocasião, Allan Kardec na companhia de seu
anfitrião, sua esposa e mais duas pessoas, foi à casa desse homem, na intenção de
instruir-se sobre o fenômeno. Ouviu que sua faculdade se revelou quando da
manifestação da enfermidade, crendo que Deus quis lhe dar certa compensação.
Rosto expressivo e alegre, olho vivo, inteligente e penetrante, só fala o
dialeto alemão da região não entendendo nada de francês, vivendo do produto de
algumas peças da terra e de seu trabalho pessoal, não sofrendo necessidade, sem
estar numa posição confortável. Procurado por desconhecidos para uma consulta,
seu primeiro movimento é de desconfiança, sondando suas intenções, respondendo
só se ocupar de fontes, recusando qualquer experiência com o copo, crendo que
se se ocupasse com questões frívolas, especulações amorosas, realização de
algum desígnio mau, Deus lhe retiraria a faculdade. Absolutamente ignorante
sobre Espiritismo, sem a menor ideia dos médiuns, da intervenção dos Espíritos,
da ação fluídica, para ele sua faculdade está nos nervos, numa força que ele
não explica. Citando outro exemplo da precisão das visões do visitado,
inclusive em relação a si mesmo, Allan Kardec diz ser “mais
comum que se pensa, pessoas com a mesma percepção, que o copo é mero acessório,
útil apenas pelo hábito da mesma forma que a borra de café, a clara de ovos, o
côncavo das mãos, as cartas, apenas um meio de fixar a atenção, um pretexto
para falar, um suporte. (...). Porque o que tem efeito sobre um não o tem sobre
outro? Porque tantas pessoas possuem essa faculdade sem auxílio de qualquer
aparelho? É que a faculdade é inerente ao individuo e não ao copo. A imagem se
forma em si mesmo, ou melhor, nas irradiações fluídicas que dele emanam. O copo
não oferece, por assim dizer, senão o reflexo dessa imagem: é um efeito, e não
uma causa. (...). E isto é tão verdadeiro, que certas pessoas veem
perfeitamente com os olhos fechados. A visão espiritual é, na realidade, o sexto sentido
ou sentido espiritual, de que tanto se falou e que, como os outros sentidos,
pode ser mais ou menos obtuso ou sutil. Ele
tem como agente o fluido perispiritual, como a visão física tem por agente o fluido
luminoso. Assim como a radiação do fluido perispiritual traz à alma certas
imagens e certas impressões. Esse fluido, como todos os outros, tem seus
efeitos próprios, suas propriedades sui generis. . Sendo o homem
composto de Espírito, períspirito e corpo, durante a vida as percepções se
produzem, ao mesmo tempo, pelos sentidos orgânicos e pelo sentido espiritual;
depois da morte, os sentidos orgânicos são destruídos mas, restando o
períspirito, o Espírito continua a perceber pelo sentido espiritual, cuja
sutileza aumenta em razão do desprendimento da matéria. O homem em quem tal
sentido é desenvolvido goza, assim, por antecipação, de uma parte das sensações
do Espírito livre. Posto que amortecido pela predominância da matéria, o
sentido espiritual não deixa de produzir sobre todas as criaturas uma porção de
feitos reputados maravilhosos, por falta de conhecimento do princípio. Estando
esta faculdade na Natureza, pois depende da constituição do Espírito, então
existiu em todos os tempos; mas, como todos os efeitos cuja causa é
desconhecida, a ignorância o atribuía a causas sobrenaturais. Os que a possuíam
em grau eminente e podiam falar, saber e fazer coisas acima do alcance comum,
ou eram acusados de pactuar com o diabo, qualificados de feiticeiros e
queimados vivos; enquanto outros eram beatificados, como tendo o dom dos
milagres, quando, na realidade, tudo se reduzia à aplicação de uma lei
natural”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário