O
rótulo de Espírita, a exemplo de qualquer outro, significa quase nada do ponto
de vista do aproveitamento da individualidade na sua passagem pela nossa
Dimensão. Uma matéria reproduzida na edição de setembro de 1865 da REVISTA ESPÍRITA confirma essa conclusão.
O caso foi relatado a Allan Kardec em 10 de janeiro
daquele ano por correspondente da cidade de Lyon. Envolvia um indivíduo espírita
que sob o domínio dessa crença se melhorou, embora não a tivesse aproveitado
tanto quanto poderia tê-lo feito, devido à sua inteligência. Vivia com uma
velha tia, que o amava como filho, e que não poupava trabalhos nem sacrifícios
por seu caro sobrinho. Por economia era a boa mulher que cuidava da casa. Até
aí tudo muito natural; o que o era menos é que o sobrinho, jovem e em boa
forma, a deixava fazer trabalhos acima de sua força, sem que jamais lhe
acudisse à ideia poupar-lhe marchas penosas para a sua idade, o transporte de
fardos e coisas semelhantes. Na casa não mudava um móvel de lugar, como se
tivesse criados às suas ordens; e mesmo que previsse algum penoso serviço
excepcional, arranjava um pretexto para se abster, temeroso de que lhe pedissem
um auxílio, que não poderia recusar. Entretanto, havia recebido várias lições a
respeito, poder-se-ia dizer afrontas, capazes de fazer refletir um homem de
coração; mas era insensível (...). Era estimado
como um homem decente e de boa conduta, (...). Em consequência dos esforços que
fazia, a velha senhora foi acometida por uma hérnia muito grave, que a fazia
sofrer muito, mas que ela tinha coragem para não se lamentar. Um dia, provavelmente querendo esquivar-se a um
trabalho penoso, o sobrinho saiu cedo e não voltou. Ao atravessar uma ponte,
foi vitima da queda da viatura em que estava
e arrastado por uma encosta, morreu duas horas depois. Informados do fato, quisemos evocá-lo, e ouvimos
de um dos nossos guias: “Não poderá comunicar-se antes de algum
tempo. Neste momento ele está muito perturbado pelos pensamentos que o agitam.
Vê a tia e a doença que ela contraiu em consequência das fadigas corporais e da
qual ela morrerá. É isto que o atormenta, pois se considera como o seu
assassino. E o é, com efeito, já que lhe podia poupar o trabalho que será a
causa de sua morte. Para ele é um remorso pungente que o perseguirá por muito
tempo, até que tenha reparado a sua falta. Ele queria fazê-lo; não deixa a tia,
mas seus esforços são inúteis e, então, se desespera. É preciso, para o seu
castigo, que a veja morrer devido à sua negligência egoísta, porque sua conduta
é uma variedade do egoísmo. Orai por ele, a fim de que possa manter o
arrependimento, que mais tarde o salvará”. Dirigiram ao Benfeitor
Espiritual a seguinte pergunta: - Poderia
dizer-nos se não lhe serão levados em conta outros defeitos de que se corrigiu
por causa do Espiritismo e se sua posição não se abrandou? Explicou o seguinte: – Sem nenhuma dúvida, essa melhora
lhe é levada em conta, pois nada escapa ao olhar perscrutador da Divina
Providência. Mas eis de que maneira cada boa ou má ação tem suas consequências
naturais, inevitáveis, conforme estas palavras do Cristo: “A cada um segundo
as suas obras”. Aquele que se
corrigiu de algumas faltas se poupa da punição que elas teriam acarretado e, ao
contrário, recebe o prêmio das qualidades que as substituíram; mas não pode
escapar às consequências dos defeitos que ainda ficaram. Assim, não é punido
senão na proporção e conforme a gravidade destes últimos; quanto menos os
tiver, melhor a sua posição. Uma qualidade não resgata um defeito; diminui o
número destes e, por conseguinte, a soma das punições. Os defeitos dos quais se
corrigem primeiro, são os mais fáceis de ser extirpados, e aquele do qual se
libertam mais dificilmente é o egoísmo. Julgam ter feito bastante porque
moderaram a violência do caráter, se resignaram à sorte ou se livraram de
alguns maus hábitos; sem dúvida é algo que aproveita, mas não impede de pagarem
o tributo de depuração pelo resto. Meus amigos, o egoísmo é o que melhor se vê
nos outros, porque sentimos o seu contragolpe e porque o egoísta nos fere; mas
o egoísta encontra em si mesmo sua satisfação, razão por que dele não se
apercebe. O egoísmo é sempre uma prova de secura do coração; estiola a
sensibilidade para os sofrimentos alheios. (...) Do egoísta não espereis senão
a ingratidão; o reconhecimento em palavras nada lhe custa, mas em ação o
fatigaria e lhe perturbaria o repouso. Só age por outro quando forçado, e
jamais espontaneamente; seu apego está na razão do bem que espera das pessoas,
e isto algumas vezes mau grado seu. (...)
O egoísmo é o verme roedor da sociedade, é mais ou menos o de cada um de vós.
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