Fechando
a edição de março de 1869 da REVISTA
ESPÍRITA, Allan Kardec reproduz
interessante mensagem escrita por um Espírito identificado como Halévy
obtida no Grupo Déliens, no dia 16 do mês anterior enfocando o tema A MEDIUNIDADE E A INSPIRAÇÃO. A avaliação de Kardec coloca a mensagem entre
as que merecem ser lidas pela lógica e teor de seu conteúdo. Dia ela: -“ Sob suas formas variadas ao infinito, a
mediunidade abarca a Humanidade inteira, como uma rede à qual ninguém pode
escapar. Cada um, estando em contato diário, saiba-o ou não, queira-o ou se
revolte, com inteligências livres, não há um homem que possa dizer: Não fui, não sou ou não serei médium.
Sob a forma intuitiva, modo de
comunicação ao qual vulgarmente se deu o nome de voz da consciência, cada um
está em relação com várias influências espirituais, que aconselham num ou
noutro sentido e, muitas vezes, simultaneamente, o bem puro, absoluto;
acomodações com o interesse; o mal em toda a sua nudez. – O homem evoca essas
vozes; elas respondem ao seu apelo, e ele escolhe; mas escolhe entre essas
diversas inspirações e o seu próprio sentimento. – Os inspiradores são amigos invisíveis; como os amigos da Terra, são
sérios ou eventuais, interesseiros ou verdadeiramente guiados pela afeição. São consultados, ou aconselham
espontaneamente, mas, como os conselhos dos amigos da Terra, seus conselhos
são ouvidos ou rejeitados; por vezes provocam um resultado contrário ao que se
espera; muitas vezes não produzem qualquer efeito. – Que concluir daí? Não que
o homem esteja sob a ação de uma mediunidade incessante, mas que obedece
livremente à sua própria vontade, modificada por avisos que, no estado normal,
jamais podem ser imperativos. Quando o homem faz mais do que se ocupar dos
mínimos detalhes de sua existência, e quando se trata de trabalhos que ele veio
realizar mais especialmente, de provas decisivas que deve suportar, ou de obras
destinadas à instrução e à elevação gerais, as vozes da consciência não se
fazem mais somente e apenas conselheiras, mas atraem o Espírito para certos
assuntos, provocam certos estudos e colaboram na obra, fazendo ressoar certos
compartimentos cerebrais pela inspiração. Aqui é uma obra a dois, a três, a
dez, a cem, se quiserdes; mas, se cem nela tomaram parte, só um pode e deve
assiná-la, porque só um a fez e é o seu responsável! Afinal de contas, o que é
uma obra, seja qual for? Jamais é uma criação; é sempre uma descoberta. O homem
nada faz, tudo descobre. É preciso não confundir esses dois termos. Inventar,
no seu verdadeiro sentido, é tornar evidente uma lei existente, um conhecimento
até então desconhecido, mas posto em germe no berço do Universo. Aquele que
inventa levanta uma das pontas do véu que oculta a verdade, mas não cria a
verdade. Para inventar é preciso procurar e procurar muito; é preciso compulsar
os livros, rebuscar no fundo das inteligências, pedir a um a Mecânica, a outro
a Geometria, a um terceiro o conhecimento das relações musicais, a um outro,
ainda, as leis históricas e, do todo, fazer algo novo, interessante,
inimaginável. Aquele que foi explorar os recantos das bibliotecas, que ouviu
falarem os mestres, que perscrutou a Ciência, a Filosofia, a Arte, a Religião,
da antiguidade mais remota até os nossos dias, é o médium da Arte, da História,
da Filosofia e da Religião? É o médium dos tempos passados, quando por sua vez
escreve? Não, porque não conta pelos outros, mas ensinou os outros a contar e
enriquece os seus relatos de tudo o que lhe é pessoal. – Por muito tempo o
músico ouviu a toutinegra e o rouxinol, antes de inventar a música; Rossini
escutou a Natureza antes de traduzi-la para o mundo civilizado. Ele é o médium
do rouxinol e da toutinegra? Não: compõe e escreve; escutou o Espírito que lhe
veio cantar as melodias do céu; ouviu o Espírito que clamou a paixão ao seu
ouvido; ouviu gemerem a virgem e a mãe, deixando cair, em pérolas harmoniosas,
sua prece sobre a cabeça do filho. O amor e a poesia, a liberdade, o ódio, a
vingança e numerosos Espíritos que possuem esses sentimentos diversos, cada um
por sua vez cantou a sua partitura ao seu lado. Ele as escutou, as estudou, no
mundo e na inspiração, e de um e outro fez as suas obras. Mas não era médium,
como não é médium o médico que ouve os doentes contando o que sofrem, e que dá
um nome às suas doenças. – A mediunidade teve suas horas num como no outro; mas
fora desses momentos muito curtos para a sua glória, o que fez, o fez apenas à
custa dos estudos colhidos dos homens e dos Espíritos. Sendo assim, é-se médium
de todos; é-se médium da Natureza, médium da verdade e médium muito imperfeito,
porque muitas vezes a mediunidade aparece de tal modo desfigurada pela
tradução, que é irreconhecível e desconhecida.
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