Confirmando
através de inúmeros exemplos e testemunhos obtidos via mediunidade que a Lei de
Causa e Efeito leva sempre o Espírito ao encontro dos resultados de suas ações,
o Espiritismo afirma também que a família consanguínea deriva de uma família
espiritual derivada das relações interpessoais mal sucedidas nas encarnações
que temos. O caso analisado por Allan Kardec no número de outubro
de 1864 da REVISTA ESPÍRITA,
ilustra isso. Parte de fato noticiado no jornal no SIÈCLE de 5 de junho daquele
ano: “O Sr. X..., berlinense, possuía imensa fortuna. Seu pai, ao contrário,
em consequência de vários reveses, tinha caído em extrema miséria e se vira
forçado a recorrer à generosidade do filho. Este repeliu duramente a súplica do
ancião que, para não morrer de fome, teve de recorrer à intervenção da justiça.
O Sr. X... foi condenado a fornecer ao pai uma pensão alimentar. Mas, antes, havia
tomado suas precauções: prevendo que parte de seus rendimentos poderia ser
confiscada, caso se recusasse a pagar a pensão, resolveu ceder a fortuna a um
tio paterno. “O infeliz pai viu-se privado de sua última esperança. Protestou
que a cessão era fictícia e que o filho tinha recorrido a ela para escapar à
execução da sentença. Mas teria que o provar; o velho, porém, não dispunha de
condições para intentar um processo custoso, já que lhe faltavam as coisas
essenciais à vida. “Um acontecimento imprevisto veio mudar tudo. O tio morreu
subitamente, sem deixar testamento. Como não tivesse família, a fortuna
reverteu, de direito, ao parente mais próximo, isto é, ao seu irmão.
“Compreende-se o resto. Hoje os papéis estão invertidos. O pai está rico e o
filho pobre. O que, sobretudo, deve aumentar o desespero deste último é que não
pode invocar o fato de uma cessão fictícia, pois a lei interdita formalmente
esse gênero de transação”. Comenta Kardec: Dir-se-ia que se sempre fosse assim com o
mal, melhor seria compreendida a justiça do castigo; sabendo o culpado por que
é punido, saberia do que se deve corrigir. Os exemplos de castigos imediatos
são menos raros do que se pensa. Se se remontasse à fonte de todas as
vicissitudes da vida, ver-se-ia, aí, quase sempre, a consequência natural de
alguma falta cometida. A cada instante recebe o homem terríveis lições, das
quais, infelizmente, bem poucos tiram proveito. Enceguecido pela paixão, não vê
a mão de Deus, que o fere; longe de acusar-se por seus próprios infortúnios,
põe a culpa na fatalidade e na má sorte; irrita-as muito mais do que se
arrepende. Aliás, não nos surpreenderíamos se o filho, do qual se fala acima,
em vez de ter reconhecido seus erros para com o pai, em lugar de lhe ter
dispensado melhores sentimentos, passasse a lhe devotar maior animosidade. Ora,
o que pede Deus ao culpado? O arrependimento e a reparação voluntária. Para o
animar a isto multiplica à sua volta, durante a vida inteira, todas as formas
de advertências: desgraças, decepções, perigos iminentes; numa palavra, tudo o
que é próprio a fazê-lo refletir. Se, a despeito disto, seu orgulho resiste,
não é justo que seja punido mais tarde? É grave erro pensar que o mal possa
ficar impune, uma ou outra vez, na vida atual. Se se soubesse tudo quanto
acontece ao mau, aparentemente o mais próspero, ficar-se-ia convencido da
verdade de que não há uma única falta nesta vida, uma só inclinação má, dizemos
mais, um só mau pensamento que não tenha sua contrapartida. Daí a consequência
que, se o homem aproveitasse os avisos que recebe, se se arrependesse e
reparasse desde esta vida, teria satisfeito à justiça de Deus e não mais teria
de expiar, nem de reparar, seja no mundo dos Espíritos, seja em nova
existência. Se há, pois, os que nesta vida sofrem o passado de sua precedente
existência, é que devem pagar uma dívida que não saldaram. Se o filho em
questão morrer na impenitência, sofrerá, primeiramente, no mundo dos Espíritos,
o castigo do remorso; sofrerá moralmente o que fez sofrer materialmente; será
um Espírito infeliz, porque terá violado a lei que lhe dizia: Honra teu pai e
tua mãe. Mas Deus, que é soberanamente bom e, ao mesmo tempo, soberanamente
justo, permitirá que ele reencarne para reparar; talvez lhe dê o mesmo pai e,
em sua bondade, lhe poupe a humilhante lembrança do passado; mas o culpado
trará consigo a intuição das resoluções que tiver tomado, a vontade de fazer o
bem, ao invés do mal; será a voz da consciência que lhe ditará a conduta.
Depois, quando retornar ao mundo dos Espíritos, Deus lhe dirá: Vem a mim, meu
filho, tuas faltas estão apagadas. Mas, se falhar nessa nova prova, terá de
recomeçar, até que se tenha despojado inteiramente do homem velho. Deixemos,
pois, de ver nas misérias que sofremos pelas faltas de uma existência anterior
um mistério inexplicável e digamos que de nós depende evitá-las, obtendo nosso
perdão desde esta vida. Depois de saldar nossas dívidas, Deus não nos fará
pagá-las segunda vez; mas se permanecermos surdos às suas advertências, então
exigirá até o último ceitil, ainda que após vários séculos ou milhares de anos.
Para isto não exige vãos simulacros, mas a reforma radical do coração. A morada
dos eleitos só é aberta aos Espíritos purificados; qualquer mácula lhes
interdita o acesso. Cada um pode pretendê-lo; compete a todos fazer o que a
isto for necessário e lá chegar, mais cedo ou mais tarde, conforme seus
esforços e sua vontade. Mas jamais dirá Deus a alguém: Não te purificarás!
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