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domingo, 29 de janeiro de 2017

A ARTE E O ESPIRITISMO

Dramaturgo, poeta e romancista francês, Alfred Musset morreu um mês depois da publicação d’ O LIVRO DOS ESPÍRITOS, e, portanto do surgimento do ESPIRITISMO. Tendo-se manifestado espontaneamente na reunião da Sociedade Espírita de Paris de 23 de novembro de 1860, Allan Kardec buscou sua opinião sobre se haveria um dia a arte espírita. Na extensa resposta constante na edição de dezembro de 1860 da REVISTA ESPÍRITA, entre outras coisas, disse o intelectual: “Fazeis uma pergunta respondida por si mesma. O verme é verme, torna-se bicho da seda, depois borboleta. Que há de mais etéreo, de mais gracioso do que uma borboleta? Pois bem! a arte pagã é o verme; a arte cristã é o casulo; a arte espírita será a borboleta.” Quanto mais se aprofunda o sentido dessa graciosa comparação, mais se lhe admira a exatidão. À primeira vista poder-se-ia supor que o Espírito tivesse a intenção de rebaixar a arte cristã, colocando a arte espírita no coroamento do edifício; mas não há nada disso, e basta meditar nessa imagem poética para assimilar-lhe a precisão. De fato, o Espiritismo se apoia essencialmente no Cristianismo; de modo algum vem substitui-lo: completa-o e o reveste com uma túnica brilhante. Nos primórdios do Cristianismo encontram-se os germes do Espiritismo; se eles se repelissem mutuamente, um renegaria o seu filho, e o outro, o seu pai. Comparando o primeiro ao casulo e o segundo à borboleta, o Espírito indica perfeitamente o laço de parentesco que os une. Há mais: A própria imagem descreve o caráter da arte que um inspirou e que o outro inspirará. A arte cristã teve de inspirar-se nas terríveis provações dos mártires e revestir a severidade de sua origem materna. Representada pela borboleta, a arte espírita inspirar-se-á nas vaporosas e esplêndidas paisagens da existência futura que se desvenda; deleitará a alma que a arte cristã havia tomado de admiração e de temor; será o canto de alegria após a batalha. O Espiritismo encontra-se inteiramente na teogonia pagã, e a mitologia não passa de um quadro da vida espírita poetizada pela alegoria. (...) A arte necessariamente teve de inspirar-se nessa fonte tão fecunda para a imaginação; mas para elevar-se até o sublime do sentimento, faltava-lhe o sentimento por excelência: a caridade cristã. Não conhecendo os homens senão a vida material, a arte procurou, antes de tudo a perfeição da forma. A beleza corporal, então, era a primeira de todas as qualidades: a arte apegou-se a reproduzi-la, a idealizá-la; mas só ao Cristianismo estava reservada a tarefa de fazer ressaltar a beleza da alma sobre a beleza da forma; assim, a arte cristã, tomando a forma na arte pagã, adicionou-lhe a expressão de um sentimento novo, desconhecido dos Antigos. Mas, como dissemos, a arte cristã ressentiu-se da austeridade de sua origem e inspirou-se nos sofrimentos dos primeiros adeptos; as perseguições impeliram os homens a uma vida de isolamento e de reclusão, e a ideia do inferno à vida ascética. Eis por que a pintura e a escultura são inspiradas, em três quartos dos casos, pelo quadro das torturas físicas e morais; a arquitetura se reveste de um caráter grandioso e sublime, embora sombrio; a música é grave e monótona como uma sentença de morte; a eloquência é mais dogmática do que comovente; a própria beatitude é marcada pelo tédio, pela ociosidade e pela satisfação toda pessoal; aliás, encontra-se tão longe de nós, colocada tão alto, que nos parece quase inacessível; daí por que nos toca pouco, quando a vemos reproduzida na tela ou no mármore. O Espiritismo nos mostra o futuro sob uma luz mais ao nosso alcance; a felicidade está mais perto de nós, ao nosso lado, nos próprios seres que nos cercam, com os quais podemos entrar em comunicação; a morada dos eleitos não é mais isolada: há solidariedade incessante entre o Céu e a Terra; a beatitude já não é uma contemplação perpétua, que não passaria de eterna e inútil ociosidade, mas, sim, uma constante atividade para o bem, sob o próprio olhar de Deus; não está na quietude de uma contemplação pessoal, mas no amor mútuo de todas as criaturas chegadas à perfeição. (...) Quando estas ideias estiverem popularizadas, o que não deve tardar, porquanto os cegos da geração atual diariamente desaparecem da cena, a geração nova terá menos preconceitos, pela própria força das coisas.

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