Uma das mais instigantes revelações
do Espiritismo é a que se refere aos mecanismos da Justiça Divina que afirma estarmos inexoravelmente presos aos efeitos de nossas ações em qualquer um dos
níveis em que se manifestam. O desconhecimento das posições declaradas por Allan
Kardec sobre o tema gera muitas confusões entre os que se interessam
pelo tema. No número de setembro de 1863, da REVISTA ESPÍRITA, encontramos alguns
argumentos do Codificador que podem nos auxiliar a entender melhor o assunto Expiação e Prova.
Diz ele: A expiação implica necessariamente a ideia de um castigo mais ou
menos penoso, resultado de uma falta cometida; a prova implica sempre a de uma
inferioridade real ou presumida, porquanto, aquele que chegou ao ponto
culminante a que aspira, não mais necessita de provas. Em certos casos, a prova
se confunde com a expiação, isto é, a expiação pode servir de prova, e
reciprocamente. O candidato que se apresenta para receber uma graduação, passa
por uma prova. Se falhar, terá de recomeçar um trabalho penoso; esse novo
trabalho é a punição da negligência que apresentou no primeiro; a segunda prova
torna-se, assim, uma expiação. Para o condenado a quem se faz esperar um
abrandamento ou uma comutação, se bem se conduzir, a pena é, ao mesmo tempo,
uma expiação por sua falta e uma prova para sua sorte futura. Se, à sua saída
da prisão, não estiver melhor, a prova é nula e um novo castigo desencadeará
uma nova prova. Considerando-se, agora, o homem na Terra, vemos que ele aí
suporta males de toda a sorte, muitas vezes cruéis. Esses males têm uma causa.
Ora, a menos que os atribuamos ao capricho do Criador, somos forçados a admitir
que a causa esteja em nós mesmos, e que as misérias que experimentamos não
podem ser o resultado de nossas virtudes; portanto, têm sua fonte nas nossas
imperfeições. Se um Espírito encarnar-se na Terra em meio à fortuna, honras e
todos os prazeres materiais, pode-se dizer que sofre a prova do arrastamento;
para o que cai na desgraça por sua má conduta ou imprevidência, é a expiação de
suas faltas atuais e pode dizer-se que é punido por onde pecou. Mas que dizer
daquele que, desde o nascimento, está em luta com as necessidades e as
privações, que arrasta uma existência miserável e sem esperança de melhora, que
sucumbe ao peso de enfermidades congênitas, sem nada ter feito, ostensivamente,
para merecer tal sorte? Quer seja uma prova, ou uma expiação, a posição não é
menos penosa e não seria mais justa do ponto de vista do nosso correspondente,
porquanto, se o homem não se lembra da falta, também não se lembra de haver
escolhido a prova. Tem-se, assim, de buscar alhures a solução da questão. Como
todo efeito tem uma causa, as misérias humanas são efeitos que devem ter uma
causa; se esta não estiver na vida atual, deve estar numa vida anterior. Além
disso, admitindo a justiça de Deus, tais efeitos devem ter uma relação mais ou
menos íntima com os atos precedentes, dos quais são, ao mesmo tempo, castigo
para o passado e prova para o futuro. São expiações no sentido de que são
consequência de uma falta, e provas em relação ao proveito que delas se retira.
Diz-nos a razão que Deus não pode ferir um inocente. Se, pois, formos feridos,
é que não somos inocentes: o mal que sentimos é o castigo, a maneira por que o
suportamos é a prova. Mas acontece, muitas vezes, que a falta não se acha nesta
vida. Então se acusa a justiça de Deus, nega-se a sua bondade, duvida-se mesmo
de sua existência. Aí, precisamente, está a prova mais escabrosa: a dúvida
sobre a divindade. Quem quer que admita um Deus soberanamente justo e bom deve
dizer que ele não pode agir senão com sabedoria, mesmo naquilo que não
compreendemos e, se sofremos uma pena, é porque o merecemos; é, pois, uma
expiação. O Espiritismo, pela grande lei da pluralidade das existências,
levanta completamente o véu sobre o que esta questão deixava no escuro. Ele nos
ensina que se a falta não foi cometida nesta vida, o foi numa outra e, deste
modo, que a justiça de Deus segue o seu curso, punindo-nos por onde havíamos
pecado.
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