O artigo abre a edição de abril
de 1859 da REVISTA ESPÍRITA com
Allan
Kardec oferecendo aos leitores argumentos sobre a missão do
Espiritismo. Diz ele: - Todos nós, sem exceção, mais cedo ou mais tarde
atingiremos o termo fatal da vida; nenhuma força nos poderá subtrair a essa
necessidade, eis o que é positivo. As preocupações do mundo muitas vezes nos
desviam o pensamento daquilo que se passa além-túmulo; quando, porém, chega o
momento supremo, poucos são os que não se perguntam em que se transformarão,
pois a idéia de deixar a existência sem possibilidade de retorno tem algo que
corta o coração. Realmente, quem poderia encarar com indiferença a hipótese de
uma separação absoluta e eterna de tudo quanto amou? Quem poderia ver sem pavor
abrir-se à sua frente o imenso abismo do nada, em que iriam desaparecer para
sempre todas as nossas faculdades, todas as nossas esperanças? “Quê! depois de
mim o nada; nada mais que o vazio; tudo acabado e sem retorno; mais alguns dias
e a minha lembrança se apagará na memória dos que me sobreviverem; em breve não
restará nenhum traço de minha passagem na Terra; o próprio bem que fiz será
esquecido pelos ingratos a quem obsequiei; e nada compensará tudo isso, nenhuma
outra perspectiva a não ser meu corpo sendo roído pelos vermes.” Este quadro do
fim de um materialista, traçado por um Espírito que tinha vivido esses
pensamentos, não tem algo de horrível, de glacial? Ensina-nos a religião que
não pode ser assim, e a razão no-lo confirma. Mas essa existência futura, vaga
e indefinida, nada tem que satisfaça o nosso amor do que é positivo. É isso que
gera a dúvida em muitas pessoas. Consideremos que tenhamos uma alma. Mas o que
é a nossa alma? Terá uma forma, uma aparência qualquer? É um ser limitado ou
indefinido? Dizem uns que é um sopro de Deus; outros que é uma centelha;
outros, que é uma parte do grande todo, o princípio da vida e da inteligência.
Mas o que significa tudo isso? Diz-se, ainda, que é imaterial. Mas uma coisa
imaterial não poderia ter propriedades definidas; para nós isto nada
representa. Ensina-nos ainda a religião que seremos felizes ou infelizes,
conforme o bem ou o mal que houvermos feito. Mas o que é essa felicidade que
nos espera no seio de Deus? Será uma beatitude, uma contemplação eterna, sem
outro objetivo além de cantar louvores ao Criador? Serão as chamas do inferno
uma realidade ou uma ficção? A própria Igreja o entende nesta última acepção,
mas quais são esses sofrimentos? Onde o lugar do suplício? Em suma, o que se
faz e o que se vê nesse mundo que nos espera a todos? Diz-se que ninguém voltou
até agora para nos dar informações. Eis aí um erro, e a missão do Espiritismo é
precisamente esclarecer-nos sobre esse futuro, fazendo-nos, até certo ponto,
tocá-lo e vê-lo, não mais pelo raciocínio, mas pelos fatos. Graças às
comunicações espíritas isso já não é uma presunção, uma probabilidade, sobre a
qual cada um imagina à vontade, os poetas embelezam com as suas ficções ou
semeiam de imagens alegóricas e enganadoras; é a própria realidade que nos
aparece, pois são os próprios seres de além-túmulo que nos vêm descrever a sua
situação e dizer-nos o que fazem, permitindo-nos, por assim dizer, assistir a
todas as peripécias de sua nova vida e mostrando-nos, desse modo, a sorte
inevitável que nos aguarda, conforme nossos méritos e deméritos. Haverá nisso
algo de anti-religioso? Muito ao contrário, pois os incrédulos nele encontram a
fé e os tíbios uma renovação do fervor e da confiança. O Espiritismo é, pois, o
mais poderoso auxiliar da religião. Se existe é porque Deus o permite, para
reanimar nossas esperanças vacilantes e nos reconduzir à senda do bem, pela
perspectiva do futuro que nos aguarda.
Nenhum comentário:
Postar um comentário