Eles sempre estiveram
presentes: os que tentam vender os serviços dos Espíritos para poupar os
interessados de qualquer tipo de esforço. Problemas de relacionamento,
casamento, emprego, rivalidades, são algumas das opções oferecidas. Na REVISTA ESPÍRITA de maio de 1860, Allan
Kardec se serve de uma notícia publicada pelo jornal SIÈCLE para comentar o
assunto. Dizia a mesma que “um senhor de nome Felix N., jardineiro das
proximidades de Órleans, passava por ter a habilidade de isentar os candidatos
à prestação do serviço militar do sorteio, isto é, de os fazer alcançar um bom
número. Prometeu a um deles, jovem vinhateiro, fazê-lo tirar o número que
quisesse, mediante 60 francos, dos quais 30 adiantadamente e 30 após o sorteio.
O segredo consistia em rezar três Pater e três Ave Maria durante nove dias.
Além disso, o feiticeiro afirmava que, graças ao que fazia de sua parte, a
coisa favorecia o rapaz e o impediria de dormir durante a última noite, mas
ficaria isento. Infelizmente o encanto não funcionou: o candidato dormiu como de costume e tirou o
número 31, que o fez soldado. Repetidos os fatos duas vezes, o segredo não foi
mantido e o feiticeiro Felix foi levado à Justiça”. Comenta Kardec: “Os
adversários do Espiritismo, o acusam de despertar ideias supersticiosas. Mas,
que é o que há de comum entre a Doutrina que ensina a existência do Mundo
Invisível, comunicando-se com o visível, e os fatos da natureza do que
relatamos, que são os verdadeiros tipos de superstição? Onde se viu o Espiritismo
ensinar semelhantes absurdos? Se os que
o atacam a tal respeito se tivessem dado ao trabalho de estuda-lo, antes de o
julgar tão levianamente, saberiam que não só condena todas as práticas
divinatórias, como lhes demonstra a nulidade. Portanto, como temos dito muitas
vezes, o estudo sério do Espiritismo tende a destruir as crenças realmente
supersticiosas. Na maioria das crenças populares há, quase sempre, um fundo de
verdade, mas desnaturado, amplificado. São os acessórios, as falsas aplicações
que, a bem dizer, constituem a superstição. Assim é que os contos de fadas e de
gênios repousam sobre a existência de Espíritos bons e maus, protetores e
malévolos; que todas as histórias de aparições tem sua fonte no fenômeno real
das manifestações espíritas, visíveis e, mesmo, tangíveis. Tal fenômeno, hoje
perfeitamente verificado e explicado, entra na categoria dos fenômenos
naturais, que são uma consequência das Leis Eternas da Criação. Mas o homem
raramente se contenta com a Verdade que lhe parece muito simples: ela a reveste
com todas as quimeras criadas pela imaginação e é então que cai no absurdo. Vem
depois os que tem interesse em explorar essas mesmas crenças, às quais juntam
um prestigio fantástico, próprio a servir aos seus objetivos. Daí essa turba de
adivinhos, feiticeiros, ledores de sorte, contra os quais a lei se ergue com
justiça. O Espiritismo verdadeiro, racional, não é, pois, mais responsável pelo
abuso que dele possam fazer, do que o é a Medicina pelas fórmulas ridículas e
práticas empregadas por charlatães ou ignorantes. Ainda uma vez, antes de
julgá-lo, dai-vos ao trabalho de o estudar. Concebe-se o fundo de verdade de
certas crenças. Mas talvez se pergunte sobre o que pode repousar a que deu
lugar ao fato acima, crença muito espalhada no nosso interior, como se sabe.
Parece-nos que tem sua origem no sentimento intuitivo dos seres invisíveis, aos
quais se é levado a atribuir um poder que, por vezes, não tem. A existência de
Espíritos enganadores, que pululam à nossa volta, por força da inferioridade do
nosso Globo, como insetos daninhos num pântano, e que se divertem à custa dos
crédulos, predizendo-lhes um futuro quimérico, sempre próprio a adular seus
gostos e desejos, é um fato do qual temos provas diárias pelos médiuns atuais.
O que se passa aos nossos olhos aconteceu em todas as épocas, por meios de
comunicação em uso conforme o tempo e o lugar. Eis a realidade. Com o auxílio
do charlatanismo e da cupidez, a realidade passou para o estado de cresça
supersticiosa”.
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