-“Que sonho singular!... Sinto-me
arrastado por um turbilhão, cuja duração não compreendo.... Alguns amigos que
julgava mortos, convidaram-me para um passeio, e eis-nos arrastados. Para onde
vamos?... Olha! Brincadeira esquisita! A
um grupo espírita!.... Ah!. Que farsa
engraçada, ver essa boa gente conscienciosamente reunida!... Eu conhecia uma
dessas figuras... Onde a vi? Não sei (...). Eu vos ouvi, senhores e senhoras e
vos apresento meus profundos respeitos. Escreveis. Ao que me parece, e vossas
mãos ágeis sem dúvida vão transcrever o pensamento dos invisíveis!...
Espetáculo inocente!...Sonho insensato este meu.! Eis um que escreve o que digo
a mim mesmo... Mas absolutamente não sois divertidos, nem também meus amigos,
que tem rostos compassivos como os vossos – Espíritos dos que haviam morrido
antes dele, e que julga ver em sonho - (...). Ei-los em busca de um problema
insolúvel, condenado pela Ciência, pelos pensadores, pelos trabalhadores!...
Falta-lhes instrução... A ignorância é a lei de Loyola largamente aplicada.(...)
Ah!.. Se na verdade houvesse um grão de verdade em vossas elocubrações! Haveria
para o materialista matéria para o suicídio!... Olhai!. Eu vivi largamente;
desprezei a carne, revoltei-a; ri dos deveres da família, de amizade.
Apaixonado, usei e abusei de todas as volúpias, e isto com a convicção que
obedecia às atrações da matéria, única lei verdadeira em vossa Terra, e isto eu
renovarei ao meu despertar, com a mesma fúria, o mesmo ardor, a mesma
habilidade. Tomarei a um amigo, a um vizinho, sua mulher, sua filha ou sua
pupila, pouco importa, desde que, estando mergulhado nas delícias da matéria,
rendo homenagem a essa divindade, senhora de todas as ações humanas. Mas, se me
tivesse enganado?... Se tivesse deixado passar a verdade?... Se, realmente,
houvesse outras vidas anteriores e existências sucessivas após a morte? Se o
Espírito fosse uma personalidade vivaz, eterna, progressiva, rindo da morte,
retemperando-se no que chamamos provação?... Então haveria um Deus de justiça e
de bondade?(...). Oh! Então se estivésseis com a verdade, eu queimaria o
cérebro ao despertar, tão certo quanto me chamo...O relato pertence, na
verdade, a um Espírito identificado como Luiz, que se manifestou imaginando que
sonhava quando, na verdade havia desencarnado dois meses antes, em Paris,
conforme exposto por Allan Kardec em matéria inserida na REVISTA ESPÍRITA, edição de fevereiro de 1869. Descrito
por Kardec como um homem muito inteligente, escritor, assistira anos antes a
reunião da Sociedade Parisiense de
Estudos Espíritas, testemunhando diversos casos de mediunidade. Viu,
principalmente, “um sonâmbulo, que lhe deu evidentes provas de lucidez, em coisas que
lhe eram absolutamente pessoais, mas nem por isto se convenceu da existência de
um princípio espiritual”. Em reunião posterior, através de outro
médium, pela fala e não pela escrita, como da primeira vez, também
espontaneamente, ou seja, sem ter sido evocado, discorreu durante uma hora,
reproduzindo na manifestação sua atitude, gestos, a voz e a linguagem, a ponto
de ser facilmente reconhecido pelos que o conheceram. A todas as perguntas e
objeções que lhe foram feitas, pretendeu explicar tudo pelo estado de sonho,
embaraçando-se muito a uma pergunta a ele feita, da qual se esquivou várias
vezes: -“O corpo pelo qual nos falais não é o vosso, pois é magro e o vosso era
gordo. Onde está o vosso verdadeiro corpo? Não está aqui, pois não estais em
vossa casa. Quando se sonha, está-se em seu leito. Ide, pois, ver em vosso
leito se o vosso corpo lá está e dizei-nos como podeis aqui estar sem o vosso
corpo?”. Ponderando sobre o caso, Kardec em observação ao final da
matéria diz: -“Como se viu, era um tipo de materialista sensualista; jamais teria
aceitado o Espiritismo. Os homens dessa categoria buscam as consolações da vida
nos prazeres materiais; (...). Para eles o Espiritismo não é um benefício, mas
um estorvo; não há provas que possam triunfar de sua obstinação: repelem-nas,
menos por convicção do que por medo de que seja uma verdade”.
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