Na
edição de novembro de 1862 da REVISTA
ESPÍRITA, Allan Kardec inclui interessante matéria que começa contando que “nos
subterrâneos da torre de São Miguem, em Bordeaux, na França, há certo número de
cadáveres mumificados que, parece, não remontam a mais de dois ou três séculos
e que, certamente, ficaram naquele estado pela natureza do solo. Uma das
curiosidades da cidade que os estranhos não deixam de visitar. Todos os corpos
tem a pele pergaminhada; na maioria estão conservados de maneira a permitir
distinguir os traços do rosto e a expressão fisionômica; alguns”.
Kardec relata que uma série de evocações em agosto daquele ano na Sociedade Espírita de Saint-Jean d’Angély,
do Espírito que se servira daquele corpo e dois outros ligados ao caso,
resultaram numa série de informações extremamente interessantes. Foram 88
perguntas, através de diferentes médiuns, pelo processo da tiptologia,
respectivamente, nas reuniões dos dias 9,10, 11, 12, 15 e 21 de agosto, entre
as dirigidas à entidade, à ex esposa, seu amante e o Espírito
responsável pela condução dos trabalhos do grupo de estudos. Em
síntese, as diferentes manifestações revelam: 1- O enterrado vivo chamara-se Guillaume Renome, morrera em 1612, fora
enterrado por engano – o que era relativamente comum na época -; após ter visto
um homem sair de seu quarto, havia asfixiado por ciúme, a esposa em seu leito
com dois travesseiros anos antes, sem que tivesse sido descoberto; que o
Espírito da esposa foi o primeiro que lhe apareceu, para lhe censurar o crime,
vendo-a por muito tempo, também infeliz, embora fugindo um do outro,
livrando-se de sua presença quando foi decidida sua reencarnação; que morrera
enraivecido, batendo nas paredes do caixão e querendo viver a todo custo, tendo
ficado ligado ao corpo, embora não o animando, entre quinze e dezoito dias,
cercado por uma porção de Espíritos, como ele cheios de dor; que morrera
daquela forma por ter escolhido uma vida cheia de desgostos domésticos, que
suscitariam o crime cometido, que devia encher-lhe de remorsos se o realizasse;
que reencarnaria em breve, cercado por aqueles que lhe eram caros, sofrendo as
mais variadas doenças. 2) O
Espírito da esposa estava reencarnado há onze anos, em Havana, nas Antilhas; no
sexo feminino; filha de rico comerciante; devendo passar por provas como a
perda da fortuna; um amor ilegítimo e sem esperança, junto à miséria e a duros
trabalhos; amando um homem consagrado a Deus, só e sem esperança de
correspondência. 3) O amante, chama-se Jacques Noulin; sempre
gostara da boa mesa, das mulheres agradáveis e do bom vinho; fora chefe de portaria
do tribunal; que pensara algumas vezes na esposa de Guillaume depois de sua
morte, cuja lembrança passava como um relâmpago, sem deixar traços; que,
desencarnado, se ligara a Espíritos gozadores como ele, divertindo-se em pregar
peças aos invigilantes que julgam tratar com bons Espíritos”.
Comentando os conteúdos que vão além do que aqui resumido, Allan Kardec,
pondera: -“Indubitavelmente, não há qualquer meio material de constatar a
identidade dos Espíritos que se manifestaram nas evocações citadas. Assim, não
o afirmaremos de maneira absoluta. Fazemos estas reservas para os que creem que
aceitamos cegamente tudo quanto vem dos Espiritos. Pecamos antes por um excesso
de desconfiança. É que nos devemos guardar de dar como verdade absoluta aquilo
que não pode ser controlado. Na ausência de provas positivas, devemos
limitar-nos a constatar a possibilidade e buscar as provas morais, em falta de
provas físicas. Do fato em questão, as respostas tem um caráter evidente de
probabilidade e, sobretudo, de alta moralidade: não há contradições, nenhuma
dessas faltas de lógica que chocam o bom senso e delatam o embuste; tudo se
liga, tudo se encadeia perfeitamente; tudo concorda com o que a experiência já
demonstrou. Pode, pois, dizer-se que a história é, ao menos, verossimel, o que
já é muito. O que é certo, é que, não se trata de um romance inventado pelos
homens, mas de uma obra mediúnica”. Entre vários outros argumentos, diz
ainda que “a veracidade do relato foi atestado de maneira mais explícita pelos
melhores médiuns da Sociedade Espírita de Paris”.
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