Temos duas perguntas sobre um mesmo assunto, e que nos foram enviadas por pessoas que pertencem a igrejas evangélicas. A primeira é a seguinte: “Na sua carta aos hebreus, falando sobre o sacrifício de Jesus pela Humanidade, Paulo diz no capítulo 9, versículos 27 e 28: “Assim como aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo depois o juízo, assim também o Cristo, tendo-se oferecido uma vez para sempre para tirar os pecados de muitos, aparecerá segunda vez, sem pecado, aos que o aguardam para a salvação”. O Espiritismo, contudo, fala em reencarnação. Em que o Espiritismo se fundamenta para isso?
Com
certeza não é nas palavras de Paulo. A Doutrina Espírita não se apega às letras
do Novo Testamento, mas ao significado mais amplo da doutrina moral que Jesus
ensinou. Com toda certeza, há 2 mil anos atrás, os conhecimentos humanos eram
bem pobres e reduzidos, principalmente em se tratando de um povo sem projeção
literária e que vinha cultivando sua própria crença que, naqueles momentos, não
podia ser contrariada, sob pena de se estabelecer uma confusão.
A doutrina de Jesus, contudo, era bem mais
ampla do que a divulgada por Paulo. E Paulo certamente não tinha a obrigação de
conhecer tudo, pois o próprio Jesus já havia dito que, no futuro, enviaria um
Consolador que, além de reviver seus ensinos, diria muito mais coisas para as
quais o povo não estava em condições de compreender naquele momento. Jesus,
quando se referiu à reencarnação, por exemplo, sem querer chocar a velha crença
da ressureição, tratou o assunto de forma superficial e velada, como vamos encontrar
nos evangelhos.
A crença na ressurreição dos mortos e no
juízo final, caro ouvinte, vinha do povo persa nos séculos anteriores, povo que
exerceu durante muito tempo um domínio político sobre os hebreus. Segundo o
Zoroastrismo, religião persa, os mortos levantariam de seus túmulos e seriam
julgados para serem condenados ou absolvidos de seus pecados. Conhecendo essa
faceta da História (precisamos ler um pouco de História Antiga para entender
isso), vamos perceber que os hebreus absorveram por completo essa forma de
pensar, pois ela não existia antes, ao tempo de Moisés e outros profetas.
Jesus, porém, não estava interessado na crença
em si. Para ele, bastava que as pessoas confiassem em Deus e na vida futura. A
força de seus ensinamentos, pois, estava na conduta moral das pessoas e não nos
dogmas religiosos. Por isso, Jesus não chegou a tocar profundamente nessas
questões e as tratou por alto, mais interessado em que as pessoas – fossem elas
fariseus, saduceus, escribas ou samaritanos – tomassem consciência de que Deus é
Pai e quer o nosso bem e, por isso, devemos agir como irmãos, amando uns aos
outros.
Por outro lado, a crença do povo era muito
limitada. Eles precisavam acreditar em resultados próximos, imediatos, em
coisas palpáveis, e a simplicidade de seus dogmas acabavam ajudando a se
encontrarem com os ensinamentos morais de Jesus, porque todos tinham medo da
condenação eterna. Se você estudar melhor o Novo Testamento, vai perceber que o
povo acreditava que a ressurreição dos mortos e o juízo final estavam bem
próximos; isto é, aconteceriam nos anos seguintes. Leia no evangelho: “Não passará esta geração,
sem que tudo isso aconteça.”
Paulo de Tarso, que veio logo depois de
Jesus, não o conheceu pessoalmente, mas, sendo um homem instruído, procurou
interpretá-lo, ouvindo relatos de seus discípulos, principalmente de Pedro. E dentro
da sua forma de pensar, Paulo acabou dando importante contribuição ao
pensamento de Jesus, mas assim mesmo deteve-se no limite da compreensão daquele
povo.
Por
outro lado, caro ouvinte, poderíamos dizer que “o homem só morre uma vez”,
quando nos referimos à personalidade humana que nasce, cresce, desenvolve-se e
morre, como todo ser vivo. Mas o
Espírito não morre e acaba retornando à vida; não mais com aquele corpo que
morreu e que é completamente absorvido pela terra, mas em outro corpo que será
concebido especialmente para a nova encarnação. O juízo, a que Paulo se refere,
na verdade, é o julgamento infalível de nossa própria consciência, que se segue
à morte do corpo e pelo qual cada um de nós vai passar.
Em sua primeira carta aos Coríntios, capítulo
15, Paulo se refere à ressurreição de um corpo incorruptível, o que para nós,
espíritas, é o períspirito ou corpo espiritual, que se segue à morte do corpo
físico. Semeamos corpo corruptível e colhemos corpo incorruptível. “Se o Cristo ressuscitou, todos nós
ressuscitaremos” – disse ele: ou seja, após a morte, ressurgimos, não mais nesta
vida material, mas na vida espiritual, de onde podemos deduzir que a
ressurreição é processo pelo qual o Espirito ressurge na outra vida.
Jesus, o enviado, veio das altas esferas
espirituais trazer à Humanidade a sua mensagem de amor, que se consolidou a
partir da sua vida, da sua renúncia, do seu sofrimento, martírio e morte, para
que pudéssemos compreender a necessidade da transformação moral do homem. Certamente,
ele – Jesus - volta glorioso ao coração
de cada um de nós, quando nós, humanidade, despertarmos definitivamente para
uma nova maneira de viver, estabelecendo o Reino de Deus ou o Reino do Amor na
Terra. É assim que o Espiritismo pensa.
Sobre o mesmo assunto da questão anterior, um
outro ouvinte, que também pertence a um grupo evangélico, pergunta o que
acontece com as pessoas que acreditam na ressurreição dos mortos e no juízo
final, quando chegam ao mundo espiritual e percebem que a realidade não é nada
daquilo em que acreditavam.
Esta pergunta é bem oportuna porque nos ajuda
a esclarecer um aspecto muito importante a que o Espiritismo dá especial
atenção. Todos nós, sem exceção, vamos sair desta vida e adentrar o mundo
espiritual. A forma como isso vai acontecer depende de uma série de fatores. Após
essa passagem, alguns despertarão imediatamente para o mundo espiritual, outros
demorarão mais tempo e outros mais ainda. No entanto, mais cedo ou mais tarde,
todos vamos tomar consciência, um dia, de que não estamos mais vivendo na
Terra, ou seja, não temos mais um corpo físico, somente o corpo espiritual.
Esse momento de tomada de consciência depende
de cada um. Mas o que vai pesar sobre a
nossa condição de desencarnado não é o fato de termos pertencido a esta ou
àquela religião, de termos cultivado esta ou aquela crença. O que vale mesmo,
para o Espírito desencarnado, é a sua condição moral; quer dizer: é o
julgamento de sua própria consciência. É o efeito desse autojulgamento que vai
determinar se nos sentiremos bem ou mal, felizes ou infelizes.
O fato de acreditarmos nisso ou naquilo, de
ter seguido esta ou aquela religião, por mais que possa incomodar, não tem o
mesmo efeito sobre nós do que o sentimento de que fomos tomados ante o
compromisso com a vida. Se a pessoa é cristã ou judia, budista ou mulçumana, espírita
ou umbandista, isso não é relevante. Não é relevante nem mesmo o fato de não
ter religião ou de ter sido um ateu convicto. O importante para ela nesse
momento é o que ela fez e o que deixou de fazer, é o fato de se sentir bem
consigo mesma por ter feito o bem que pôde ou de sentir culpada pelo sofrimento
que causou nos outros. A religião, que professamos, serve para nos ajudar
entender melhor as leis de Deus e avançar com mais facilidade.
Uma grande curiosidade sempre chamou a
atenção das pessoas sobre a questão da morte, e este é um ponto em que, quase
sempre, as religiões se calaram, com exceção do Espiritismo, é claro. A
propósito, nos últimos anos têm aparecido nas livrarias e também no cinema,
relatos interessantes sobre pessoas que passaram pela Experiência de
Quase-Morte ou EQM. A maioria desses casos vêm dos Estados Unidos e aconteceram
em famílias de raízes protestantes, aqui chamadas de evangélicas. Citamos, por
exemplo, filmes como “O Céu é de Verdade”, “Milagres no Paraíso”, “Salvo pela
Luz” e outros, que têm levado muita gente ao cinema.
Na verdade, todo mundo se interessa pela
morte, mas a maioria das pessoas têm medo de tocar nesse assunto, por superstição,
já que todos nós vamos morrer um dia. Pois é. Todos esses relatos sempre
mostram casos de pessoas, que tiveram uma morte clínica por alguns minutos e,
depois que voltaram à vida, contaram que foram para um paraíso, um lugar lindo
e acolhedor, e lá encontraram parentes e amigos, que já haviam falecido. Essas
visões passam a ser interpretadas como visões do céu ou do paraíso.
A
questão, que se coloca, diante desses relatos, é justamente esta: e onde fica a
ressurreição? onde fica o juízo final? Ressurreição e Juízo Final são dogmas que fazem parte da crença protestante de que,
após a morte, o Espírito vai dormir e só vai acordar após a ressurreição de
seus corpos, prontas para serem submetidas ao Juizo Final. Ora, se a
Experiencia Quase-Morte está permitindo que as pessoas, logo após a morte, tomem
contato direto e imediato com familiares e conhecidos, que já estão no céu,
evidentemente que não há necessidade de se esperar a ressurreição e o juízo final.
Interessante, se você, caro ouvinte, puder ver
o filme ou ler o livro “O Céu é de Verdade”, autoria do pastor Todd Burpo, vai
verificar que, embora com certa dificuldade, os fiéis de sua igreja – numa
pequena cidade do Nebrasca, Estados Unidos
– acabaram aceitando a realidade do céu logo depois da morte, o que
significa que dispensaram de vez as noções de ressurreição dos corpos e do
juízo final. Como diz Kardec, as religiões, mais cedo ou mais tarde, acabarão
por aceitar a realidade da vida espiritual e adequando seus ensinos às novas
verdades que vão se tornando cada vez mais evidentes.
O que podemos disso concluir: que, para o
Espírito, o importante foi sua conduta na Terra. Os bons são recompensados por
sua bondade, os maus acabam prejudicados pela sua maldade. Não é Deus é aplica
o castigo, é a consciência moral de cada um. Quando ao que vamos encontrar do
lado de lá, portanto, com certeza, teremos muitas novidades, algumas das quais
podem mudar completamente as bases de nossa crença anterior, mas, com certeza,
abrirá mais a nossa compreensão sobre a sublime mensagem de Jesus. Todos somos
filhos de Deus e o Pai, como disse Jesus, nos ama a todos.
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