Indiscutivelmente, o Centro
Espírita cumpre importante papel na divulgação do Espiritismo. Por ser ele uma
proposta de interpretações livres, apesar da aparente institucionalização do
movimento em torno das ideias em federações – ou similares - estaduais ou na
nacional a que, hipoteticamente, as demais estariam subordinadas, essa dinâmica
não funciona dessa forma. O impulso derivado das duas aparições de Chico
Xavier em programas de televisão no ano de 1971, marcos na época das
pesquisas de audiência, resultou no surgimento de inúmeros Centros Espíritas,
em cidades e regiões em que as atividades práticas inspiradas na Doutrina
Espírita, aconteciam em garagens ou salas de visita da residência de
seguidores. Consequentemente, algumas dessas instituições foram ampliando
atividades e absorvendo trabalhadores transformando as Casas em polos de
assistência espiritual e material através de departamentos ou setores de
assistência social. Grupos grandes, contudo, dão origem a outros problemas
associados à imperfeições humanas como a vaidade, o egoísmo, observados nos “donos”
de áreas onde se desdobram atividades importantes no atendimento das
necessidades humanas. Deserções, intrigas, disputas internas, não são incomuns
em situações como estas. Curiosamente na edição de outubro de 1861, da REVISTA ESPÍRITA, Allan Kardec registrou sua opinião sobre tal situação. Atendia
a consulta de espíritas da cidade de Lyon, durante discurso em banquete
organizado um ano antes, em 19 de setembro de 1860, para homenageá-lo.
Esquivando-se dos elogios a ele dirigidos, creditando o valor que viam nele ao
próprio Espiritismo, entre as considerações importantes emitidas, diz haver “três
categorias de adeptos do movimento nascente: os que se limitam a acreditar na
realidade das manifestações e que antes, de mais nada, buscam os fenômenos.
Para estes o Espiritismo é simplesmente uma série de fatos mais ou menos
importantes. Os segundo veem mais que os fatos. Compreendem seu alcance
filosófico; admiram a moral dele decorrente, mas não a praticam. Para eles, a
caridade cristã é uma bela máxima, eis tudo. Os terceiros, enfim, não se
contentam em admirar a moral: praticam-na e aceitam todas as suas
consequências. Bem convencidos de que a existência terrena é uma prova
passageira, buscam tirar proveito desses curtos instantes para marchar na via
do progresso que lhes traçam os Espíritos, esforçam-se por fazer o Bem e
reprimir suas inclinações más. Suas relações são sempre seguras, porque suas
convicções os afastam de todo pensamento do mal. Em tudo, a caridade lhe é
regra de conduta. Estes são os verdadeiros Espíritas, ou melhor, os Espíritas
cristãos”. Prevenindo que seu parecer não passava de opinião pessoal,
passível da ponderação de cada um, a propósito da intenção dos
anfitriões de formar uma grande sociedade, acrescentou: -“Sabe-se que as melhores
comunicações são obtidas em reuniões pouco numerosas, nas quais reina a
harmonia e uma comunhão de sentimentos. Ora, quanto maior for o número, tanto
mais difícil será a obtenção dessa homogeneidade (...). Ao contrário, os
pequenos grupos serão sempre mais homogêneos. Todos se conhecem melhor, estão
mais em família, e podem ser melhor admitidos aqueles de desejamos. E como em
definitivo, todos tendem para um mesmo fim, podem entender-se perfeitamente e entender-se-ão
tanto melhor quanto não haja aquela discordância incessante, que é incompatível
com o recolhimento e a concentração de espírito. Os maus Espíritos, que buscam
incessantemente semear a discórdia, irritando suscetibilidades, terão sempre
menos domínio num pequeno grupo do que num meio numeroso e heterogêneo. Numa
palavra, a unidade de vistas e de sentimento será aí mais fácil de se
estabelecer”. Pondera que “a multiplicidade de grupos tem outra
vantagem: a de obter uma variedade muito maior de comunicações, pela
diversidade de aptidões dos médiuns. Que essas reuniões parciais comuniquem
reciprocamente o que elas obtém, cada uma por seu lado, e todas aproveitarão
assim os seus mútuos trabalhos (...). Do ponto de vista da propaganda – é ainda
um fato certo – não é nas grandes reuniões que os neófitos podem colher
elementos de convicção, mas bem na intimidade. Há, pois, um duplo motivo para
preferir os pequenos grupos, que se podem multiplicar ao infinito. Ora, vinte
grupos de dez pessoas, por exemplo, inquestionavelmente obterão mais e farão mais
prosélitos que uma reunião única de duzentas pessoas. Falei, a pouco, das
divergências que podem surgir, e disse que estas não devem criar obstáculos ao
perfeito entendimento entre os Centros. Com efeito, essas divergências só podem
dar-se nos detalhes e não sobre o fundo. O objetivo é o mesmo: o melhoramento
moral; o meio é o mesmo: o ensinamento dado pelos Espíritos”.
Diante do que está acontecendo atualmente no mundo – diz a ouvinte Cristiane, vemos que a justiça humana pode absolver um criminoso e condenar um inocente. O que diz o Espiritismo sobre isso?
Há dois pontos sobre os quais devemos
refletir para melhor tratar do assunto. O primeiro é que a justiça humana, como
tudo que é humano, é imperfeita e limitada – não podemos esperar perfeição de
nossas leis e nem de nossos tribunais, muito menos dos homens, mas devemos
lutar para procurar aperfeiçoar essa justiça o tanto quanto estiver ao nosso
alcance. Em segundo lugar, nada acontece por acaso: mesmos os erros
judiciários, no contexto mais amplo da vida, têm causas anteriores e devem
servir de exemplo para a necessidade de reformas e aperfeiçoamento.
Uma pessoa pode ser condenada por um ato que
não praticou. Isso é uma possibilidade, justamente porque num julgamento estão
envolvidos vários fatores, dependendo das circunstâncias presentes no fato. Aqui
no Brasil, por exemplo, tivemos na época do governo Getúlio Vargas, o famoso e
triste caso dos Irmãos Naves em Minas Gerais. Dois trabalhadores rurais foram
condenados e ficaram muitos anos na prisão, e só muito tempo depois é que se
descobriu que, na verdade, eles eram inocentes, pois o crime de que foram
acusados jamais existiu. O caso teve repercussão mundial.
É possível que o
agente de um determinado crime jamais seja descoberto ou julgado pela justiça
humana; é possível que seja julgado e inocentado, sendo ele o verdadeiro autor
da ação. Isso pode acontecer num caso em que há falta ou insuficiência de
provas, pois segundo um princípio do direito “é melhor absolver um criminoso do
que condenar um inocente”. Na medida do possível esse princípio funciona. Não
funcionou, por exemplo, para os Irmãos Naves, pois havia, inclusive, interesse
político envolvido.
A lei humana, portanto, é limitada, não pode
abarcar tudo, seus instrumentos podem ser insuficientes para detectar a
verdade, embora ela procure fazer o máximo para aplicar a justiça no seu
sentido mais amplo. Além disso, apesar da lei, entram a desonestidade e os
interesses escusos, que podem burlar essa lei, usando-a para suas conveniências,
e castigando a parte mais fraca da questão que, muitas vezes, não tem como se
defender. Contudo, a lei divina é infalível. Enquanto a lei humana depende de
uma máquina judicial complexa (constituída de tribunais, juízes, promotores e
advogados), a lei divina não depende de ninguém para ser executada.
Ela funciona automaticamente e todos os dias
para qualquer tipo de ação, mesmo aquela que nos pareça a mais insignificante,
pois, a lei de Deus está na consciência de cada um. Não será o advogado ou o
juiz que nos apontarão os erros morais que cometemos, mas a nossa própria
consciência que, mais cedo ou mais tarde, se voltará contra nós, cobrando
justiça, exigindo arrependimento e reparação. Logo, só a lei divina tem acesso
à verdade que está na alma de cada indivíduo; a lei humana não tem como
detectar, avaliar ou medir nossas verdadeiras intenções.
Jesus foi um exemplo vivo de vítima da
injustiça praticada em nome da justiça. Mas ele mesmo havia alertado seus
seguidores e ouvintes que não esperassem recompensas neste mundo, pois todos
somos imperfeitos e estamos a procura de Deus. Enquanto, lá atrás, os dez
mandamentos se referiam à recompensa terrena, pois Moisés não ensinava a vida
futura, no Sermão da Montanha a recompensa se dá além desta vida. Jesus não nos
isentou de problemas e dificuldades nesta existência.
Para a Doutrina Espírita o que se passa nesta
existência não é senão um momento na vida interminável do Espírito. Estamos
todos sujeitos a sofrer incompreensão e justiça, porque estamos vivendo num
mundo de provas e expiações em que o mal predomina. Mas as adversidades são
apenas as consequências de nosso passado. Elas fazem parte de nossa trajetória
espiritual – ou como prova, como expiação ou mesmo como missão para os
Espíritos mais elevados.
Se a vida fosse uma única, de alguma forma,
todos seríamos vítimas. Mas, só podemos ser vítimas temporárias da injustiça
humana, nunca da Justiça Divina, que é perfeita e que concorre em tudo para a
nossa felicidade futura. Os que pensam burlar a lei, levando vantagens
aparentes, estão apenas adiando seus sofrimentos para o futuro, quando terão
que responder pelos seus erros. Os que sofrem injustiça podem estar respondendo
por erros passados ou exercitando para aprender paciência, compreensão e capacidade de auto superação,
com o que poderão dar um salto na sua caminhada evolutiva.
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