Pergunta proposta: Parece que querer sofrer não é bem o objetivo da vida. As pessoas que pensam assim são masoquistas, doentes, elas têm prazer no sofrimento. No entanto, o Espiritismo dá um valor muito grande ao sofrimento, dizendo que ele é necessário para o Espírito, porque todos temos um carma e precisamos passar por ele. Antigamente as religiões se fixavam muito nisso com a prática de penitências e autoflagelação. Mas o mundo mudou, Até que ponto buscar o sofrimento ou se deixar sofrer é válido?
É interessante essa
colocação, porque nos dá margem para falar justamente da forma como as
religiões sempre viram o sofrimento. Aliás, as religiões cristãs se apoiaram na
busca do sofrimento com base no que Jesus sofreu. Elas enalteceram o sofrimento
e com a reiterada exposição dos sofrimentos de Jesus quando a caminho do
calvário, quando torturado e crucificado para nos salvar pelo sangue derramado
(segundo elas), quiseram deixar na concepção dos fiéis a ideia de que Deus quer
que soframos.
Desde então, nos meios mais
simples surgiram ordens religiosas que incentivavam a experiência da dor e
pregavam o isolamento da sociedade, para que as pessoas sofressem o que Jesus
sofreu e, desse modo, se redimissem de seus pecados para a salvação da alma.
Esse lado obscuro da religião pregava que só o sofrimento nesta vida é que
garantia a conquista do Reino dos Céus. Foi desse sentimento piedoso que
surgiram os sacrifícios e as penitencias, através dos quais o homem podia obter
favores especiais de Deus.
É claro que não é esta a
visão do Espiritismo. Para a Doutrina Espírita o que chamamos de sofrimento é
simplesmente uma condição da vida e uma reação da alma. Damos o nome de
sofrimento ao que é desagradável, desconfortável, doloroso, mas o sofrimento é
muito mais a forma como reagimos a qualquer desconforto do que o próprio
desconforto em si. Nisso não há nada de místico, pois é assim que a natureza
funciona. Veja, como exemplo, a dor do parto.
O parto é um processo natural de expulsão do feto de dentro do
útero da mãe, quando ele já se acha maduro para sobreviver fora. Então,
perguntamos: o parto é ruim? Pergunte às mães o quanto de alegria e felicidade
elas sentem quando chegam ao termo de uma gestação, trazendo para a vida um
filho seu. No entanto, o parto em si, como um trabalho, um processo natural, é
doloroso. Vê-se, portanto, que aquele sofrimento nada representa diante da
elevada compensação que a natureza lhe dá.
É assim que vemos o
sofrimento. Não como um castigo ou um mal em si, mas como uma porta que devemos
adentrar com a certeza de que depois teremos grande compensação. O estudante
que se prepara para a prova, o paciente que precisa de uma delicada cirurgia, o
jovem que aspira a uma profissão através de concurso – ou seja, tudo,
absolutamente tudo que desejamos alcançar para sermos felizes, tem um preço (
não raro uma situação de sofrimento), que a porta do sucesso e de nossa própria
realização.
O Espiritismo não faz apologia do sofrimento,
não incentiva ninguém a sofrer. Pelo contrário, aponta os caminhos menos
ásperos, quando estiver ao nosso alcance trilhá-los. Mas também não ensina a
acomodação ou a fé inoperante, combatendo toda espécie de auto sacrifício ou
auto flagelação que visam unicamente à maceração do corpo em troca de um
suposto paraíso. N’O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO encontramos um texto
intitulado “Cuidar do Corpo e da Alma”, que cuida deste tema.
O sacrifício, que o
Espiritismo recomenda, é o mesmo sacrifício que Jesus recomendou com tanta
veemência – o sacrifício do orgulho e do egoísmo, que são os defeitos morais
que mais nos fazem sofrer. Considere o quanto nos fazem sofrer nesta vida a
avareza, a ganância, a inveja, o ciúme, o ódio, a prepotência, o inconformismo,
a revolta e todos os demais sentimentos derivados do orgulho e do egoísmo.
Quando falamos em
sofrimento, temos o cuidado de colocá-lo como uma condição inerente à vida, mas
que todos podemos superar, mas com humildade, com resignação e coragem, com
determinação e vontade, com autoconfiança e fé em Deus, pois tais condições –
quando podemos alcançá-las – nos oferecem plena liberdade de viver bem, cada um
consigo mesmo, com seu próximo e com a vida.
Eis porque não devemos ver
o sofrimento, qualquer que ele seja, como um castigo ( como muitos pensam), mas
como um processo de aperfeiçoamento, que exige de nós uma tomada de consciência
de nossas necessidades de crescimento e evolução. Jesus, como um Espírito Puro,
que já superou em muito a fase em que ainda vivemos, não se aturdia com o
sofrimento, sabia encará-lo com serenidade e fé em Deus, porque já tinha
compreensão suficiente para saber aproveitá-lo, até mesmo em favor dos que se
colocavam contra ele.
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