A interpretação de muitas
pessoas – inclusive religiões e seitas - sobre fatos inabituais na realidade em
que vivemos ainda é que se trata de milagres, pertencentes ao campo do
sobrenatural. Os fenômenos que deram origem ao Espiritismo não poderiam escapar
a essa rotulagem. A Doutrina Espírita, contudo, veio para explicar e
desmistificar essa classificação, fruto do desconhecimento ou mesmo da ausência
de interesse em análises e investigações mais profundas. A propósito da questão, Allan Kardec emitiu sua
opinião no número de janeiro de 1862 da REVISTA ESPÍRITA, analisando artigo
incluído na edição anterior de sua publicação, assinada por um intelectual de
nome Guizot.
Entre outras ponderações, escreveu ele: -“ Sobre este, com sobre outros pontos de
vista, importa nos entendamos quanto à palavras. Em sua acepção própria, sobrenatural
significa o que está acima da natureza, fora das leis da natureza. O
sobrenatural, propriamente dito, não estaria submetido a leis; é uma exceção,
uma derrogação das leis que regem a Criação. Numa palavra, é sinônimo de milagre.
No
sentido próprio esses dois vocábulos passaram à linguagem figurada, servindo
para designar tudo quanto seja extraordinário, surpreendente, insólito. De uma
coisa que causa admiração diz-se que é miraculosa, como se diz que uma grande
extensão é incomensurável, de um grande número que é incalculável ou de uma
longa duração que é eterna, muito embora, a rigor, possam ser medidas,
calculadas e previsto um termo à última. Pela mesma razão qualifica-se de
sobrenatural aquilo que, à primeira vista, parece sair dos limites do possível.
O vulgo é sempre levado a tomar o vocábulo ao pé da letra na quilo que não
compreende. Se por tal se entende tudo quanto se afaste das causas conhecidas,
está bem.; mas então o vocábulo não tem mais sentido preciso, porque aquilo que
era sobrenatural ontem já não o é hoje. Quantas coisas, outrora como tal
consideradas, não fez a ciência entrar no domínio das leis naturais! Apesar dos
progressos que temos feito, podemos vangloriar-nos de conhecer todos os
segredos de Deus? Já nos disse a natureza a última palavra sobre todas as
coisas? Não temos desmentidos diários a
essa pretensão? Se, pois, aquilo que ontem era sobrenatural hoje não o é,
podemos inferir que o sobrenatural de hoje deixará de sê-lo amanhã. Para nós,
tomamos o vocábulo sobrenatural no seu mais absoluto sentido próprio, isto é,
para designar todo fenômeno contrário às leis da natureza. O caráter do fato
natural ou miraculoso é de seu excepcional. Desde que se repete é porque está
submetido a uma lei, conhecida ou não, e entra na ordem geral. Se restringirmos
a natureza ao mundo material visível é evidente que as coisas do Mundo
Invisível serão sobrenaturais. Mas estando, também, o Mundo Invisível submetido
a leis, parece-nos mais lógico definir a natureza como “o conjunto das obras
da Criação, regidas pelas leis imutáveis da Divindade”. Se,
como o demonstra o Espiritismo, o Mundo Invisível é uma das forças, um dos
poderes reagentes sobre a matéria, representa um papel importante na natureza.
Por esta razão os fenômenos espíritas para nós nem são sobrenaturais, nem
maravilhosos ou miraculosos. De onde se vê que, longe de ser ampliado o círculo
do maravilhoso, o Espiritismo tende a restringi-lo e fazê-lo desaparecer(...).
O
Sr. Guizot parte do princípio de que todas as religiões se fundam no
sobrenatural. Isto é certo se entendermos como tal aquilo que se não
compreende. Se, porém, remontarmos ao estado dos conhecimentos humanos na época
da fundação de cada religião conhecida, veremos quão limitado era o saber
humano em astronomia, física, química, geologia, fisiologia, etc. Se, nos
tempos modernos, um bom número de fenômenos já perfeitamente conhecidos e
explicados passavam por maravilhosos, com mais forte razão assim deveria ser em
tempos remotos. Acrescentemos que a linguagem figurada, simbólica e alegórica,
em uso entre os povos do Oriente, naturalmente se prestava às ficções, cujo
verdadeiro sentido a ignorância não era capaz de descobrir. Acrescentemos
ainda, que os fundadores das religiões, homens superiores à craveira comum,
conhecendo muito mais, tiveram que impressionar as massas, cercando-se de um
prestigio sobre humano, enquanto certos ambiciosos puderam explorar a
credulidade (...). Dirão que a religião se apoia sobre muitos outros fatos que
nem são explicados, nem explicáveis. Inexplicados, sim, inexplicáveis, é outra questão. Sabemos que descobertas e que conhecimentos estão
reservados ao futuro? (...). O ceticismo de muita gente não tem outra fonte
senão a impossibilidade, para eles, de tais fatos excepcionais. Negando a base
sobre que se apoiam, negam tudo o mais. Prove-se-lhes a possibilidade e a
realidade de tais fatos, reproduzam-nos aos seus olhos – e serão forçados a
acreditar”.
Gostaria de saber se tudo que passamos nesta vida, principalmente as dificuldades, os sofrimentos, é porque nós escolhemos esse caminho? Por que a gente escolheria um caminho difícil, se pode escolher um mais fácil? (Roberto Silva)
Em primeiro lugar, convém considerar que essa
questão de caminho mais fácil ou mais difícil é relativa, mas relativa à meta
que pretendemos alcançar. Um caminho pode ser mais fácil, porque não temos uma
grande meta ou uma meta compensadora, simplesmente por isso. E, então? Valerá a
pena escolhê-lo? É uma decisão que o Espírito precisa tomar.
Nesse caso, o que devemos considerar, como
você pode perceber, é a sua pretensão que pesa mais, quando se trata de
escolha, considerando, ainda, que nem todos os Espíritos têm condições de
escolher. Jesus não recomendou que
escolhemos o caminho estreito ao invés de escolher o caminho largo, porque
largo é o caminho da perdição? Ora, o
caminho largo é o mais fácil, mas não é o mais compensador, ou seja, não atende
às nossas verdadeiras necessidades de aprendizado.
Aqui na Terra, se você tem dívidas e está
desempregado há muito tempo, a sua principal meta neste momento, é obter um
emprego o mais depressa possível. Se não lhe aparece uma opção melhor, você não
terá escolha, a não ser aceitar o que lhe oferecem, mesmo que tenha de
trabalhar demais e ganhar pouco, não é mesmo? Mas, se surgirem duas ou mais
oportunidades de emprego, você poderá decidir pelo que lhe proporcionará maior
salário. Só que, para isso, terá que estudar, que se preparar e, certamente,
vai encontrar mais dificuldades para
obter o que pretende.
Agora, compare esta situação com a do Espírito
moralmente endividado. Aqui vai uma observação importante: no plano espiritual,
as necessidades do indivíduo não são de ordem material; seus problemas são de
ordem moral, como arrependimento, perdão e necessidade de paz íntima. Então,
ele se vê na contingência de se libertar dessa opressão interior, e esse sufoco
pode ser tão intenso, que ele acaba decidindo pela primeira oportunidade que
tiver. Por isso que dizemos que a questão do caminho ser mais fácil ou mais
difícil é relativa.
Quanto às causas do sofrimento na Terra,
realmente elas podem se encontrar em vidas passadas. Esta é uma probabilidade
que não podemos descartar. Mas há outras. Assim, é provável que a maior parte
dos problemas que enfrentamos atualmente provenham desta mesma encarnação, ou
seja, de nossas escolhas erradas no caminho que estamos trilhando hoje, de
nosso comodismo, enfim, da falta de habilidade para viver.
Muitos casamentos entram em crise por causa
disso, como podemos ler no capítulo 5 de O EVANGELHO SEGUNDO O
ESPIRITISMO. Muitos filhos não corresponderão
às expectativas dos pais, porque estes não souberam educá-los. Muitas doenças
comprovem a saúde das pessoas e podem
até leva-las mais cedo desta vida, porque não souberam se cuidar. Nem sempre
precisamos recorrer à reencarnação para explicar os problemas que estamos
vivendo hoje. Muitas causas, portanto, estão nesta mesma existência.
Mas o caminho nem sempre é uma simples
escolha. Ele depende também de nossas necessidades de crescimento e evolução.
Assim como a criança ainda não reúne condições para decidir tudo em sua vida,
precisando para isso da ação dos pais, desse modo também muitos Espíritos
renascem no mundo por contingência de suas próprias necessidades. É assim que
um Espírito que abusou no passado e adquiriu uma determinada doença, tem muita
probabilidade de reencarnar com tendência para ter a mesma enfermidade.
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