Se vivi outras
vidas, sofro em consequência das decisões e ações insensatas delas e essas
pessoas às quais estou ligado fazem parte de experiências mal sucedidas delas,
por que não lembro de nada? Argumento comum entre aqueles que preferem a lei do
mínimo esforço, presos à filosofia do “achismo”.
Em artigo do número de agosto
de 1863, da REVISTA
ESPÍRITA, Allan Kardec ressalta alguns pontos importantes da
questão: -“A lembrança
precisa dessas faltas teria inconvenientes extremamente graves, pois isso nos
perturbaria, nos humilharia aos nossos próprios olhos e aos do próximo; trariam
uma perturbação nas relações sociais e, por isto mesmo, travaria nosso livre
arbítrio. Por outro lado, o esquecimento não é tão absoluto quanto o supõem.
Ele só se dá na vida exterior de relação, no interesse da Humanidade; mas, a
vida espiritual não sofre solução de continuidade. Tanto como desencarnados,
quanto nos momentos de emancipação, o Espírito se lembra perfeitamente e essa
lembrança lhe deixa uma intuição que se traduz na voz da consciência, que o
adverte do que deve, ou não deve fazer. Se não a escuta, então é culpa sua.
Além disso, o Espiritismo dá ao homem um meio de remontar ao seu passado, se
não aos atos precisos, ao menos aos caracteres gerais desses atos que ficaram
mais ou menos desbotados na sua vida atual. Das tribulações que suporta, das
expiações e provas deve concluir que foi culpado; da natureza dessas
tribulações, ajudado pelo estudo de suas tendências instintivas, apoiando-se no
princípio que a mais justa punição é a consequência da falta, pode deduzir seu
passado moral. Suas tendências más lhe ensinam o que resta de imperfeito a
corrigir em si. A vida atual é para ele um novo ponto de partida: aí chega rico
ou pobre de boas qualidades; basta-lhe, pois, estudar-se a si mesmo para ver o
que lhe falta e dizer: -‘Se sou punido, é porque pequei’. E a mesma punição lhe
dirá o que fez. Citemos uma comparação. Suponhamos um homem condenado a tantos
anos de prisão, sofrendo um castigo especial, mais ou menos rigoroso conforme
sua falta: suponhamos, ainda, que ao entrar na prisão perca a lembrança dos
atos que para lá o conduziram. Poderá dizer: -‘Se estou nesta prisão, é que fui
culpado, pois não se condena gente virtuosa. Tratemos, pois, de nos tornarmos
bons, para não voltarmos quando daqui sairmos’. Quer ele saber o que fêz?
Estudando a lei penal, saberá quais os crimes que para ali conduzem, porque não
se é posto a ferros por uma maluquice; da duração e severidade da pena,
concluirá o gênero do que deve ter cometido. Para ter uma ideia mais exata,
terá apenas que estudar os artigos para os quais irá sentir-se instintivamente
arrastado. Saberá, então, o que daí em diante deverá evitar para conservar a
liberdade e a isso será ainda excitado pelas exortações dos homens de Bem,
encarregados de o dirigir e instruir no bom caminho. Se não aproveitar, sofrerá
as consequências. Tal a situação do homem na Terra onde, como condenado, não
pode ter sido posto por suas perfeições, desde que é infeliz e obrigado a
trabalhar. Deus lhe multiplica os ensinamentos proporcionais ao seu
adiantamento. Adverte-o incessantemente e o fere, até, para o despertar de seu
torpor; e o que permanece no endurecimento não pode desculpar-se com a
arrogância”. Através do médium Chico
Xavier, o Espírito André
Luiz registrou
importantes apontamentos sobre o tema: 1: -“O obscurecimento das memórias
pregressas, não é senão um fenômeno temporário, mais ou menos curto ou longo,
conforme o grau de evolução que tenhamos atingido. Até certo ponto, uma
dilatada hipnose. A passagem pelo claustro materno, o novo nome escolhido pelos
familiares, os sete anos de semi-inconsciência no ambiente fluídico dos pais, a
recapitulação da meninice, o retorno à juventude e os problemas da madureza,
com as responsabilidades e compromissos consequentes, estruturam em nós – a
individualidade eterna -, uma personalidade nova que incorporamos ao nosso
patrimônio de experiências”. 2- “Os Espíritos encarnados, tão logo
se realize a consolidação dos laços físicos, ficam submetidos a imperiosas leis
dominantes na Crosta (...). Sem a obliteração temporária da memória, não se
renovaria a oportunidade”. 3 – “Sem o esquecimento transitório, não
saberíamos receber no coração o adversário de ontem para regenerar-nos,
regenerando-o”. 4 - “Imaginemos a mente como sendo um
lago. Se as águas se acham pacificadas e límpidas, a luz do firmamento pode
retratar-se nele com segurança. Mas se as águas vivem revoltas, as
imagens se perdem ante o movimento das ondas móveis, principalmente quando o
lodo acumulado no fundo aparece à superfície”.
A questão que vamos tratar agora surgiu numa entrevista com um cientista brasileiro. Segundo ele, se os Espíritos podem revelar coisas que a ciência ainda não descobriu, a ciência não serviria para nada, pois bastava consultar os Espíritos e eles dariam a resposta para qualquer pergunta e solução para todo problema.
Aqui recaímos naquele velho
problema das pessoas que dão sua opinião sobre um tema que não conhecem. Allan
Kardec, no primeiro capítulo de “A GÊNESE”, isso em 1868, já afirmava que os
Espíritos (referindo-se aos Espíritos Superiores) não revelam aos homens aquilo
que os homens podem descobrir por si mesmos. Eles não poupam o trabalho do
homem, pois através de seu esforço e de suas realizações, que ele evolui como
Espírito. Não é difícil de entender isso. É a mesma filosofia do ensino que é
dado nas escolas. O professor não antecipa a resposta ao aluno; caso contrário,
o aluno só vai copiar a resposta, mas não vai aprender a resolver o problema.
Além do mais, em toda sua obra, Allan Kardec deixa claro que os
Espíritos não sabem tudo, pois eles são apenas as almas de homens que viveram
na Terra, imperfeitos como nós, e que
agora se acham na espiritualidade. Mesmo que se trate de Espíritos elevados,
eles não estão distantes do homem mais sábio e inteligente. O Espiritismo segue,
passo a passo, ao lado da ciência. A ele cabe revelar as coisas do mundo
espiritual, enquanto a ciência, as do mundo material, razão pela qual Kardec
acentuou bem que o Espiritismo e a ciência se completam.
Enganam-se aqueles que
pensam que os Espíritos têm resposta para tudo. Sempre que se fala em
revelações, as pessoas em geral tendem a interpretar essas revelações como
fatos sobrenaturais, miraculosos ou mágicos,
apelando para a imaginação e para a fantasia. Mas as revelações nada mais são
do que a descoberta de fatos ou de leis que, até então, eram desconhecidos do
ser humano. Logo, a ciência, tanto quanto o Espiritismo, são fontes de
revelação, que seguem a ordem natural das coisas. Aliás, o Espiritismo só
surgiu depois que a ciência passou a fazer grandes descobertas.
Mas, os Espíritos não
anteciparam algumas descobertas da ciência? – você pode perguntar. Sim, de
certa forma sim - mas de uma forma muito superficial e discreta. Evidentemente,
algumas revelações funcionaram apenas como um farol apontado para um caminho
escuro. Ele apenas faz entrever alguma coisa logo à frente, mas não revela
detalhes sobre isso, porque essa parte depende do trabalho e do esforço do
homem.
O mesmo aconteceu com
grandes visionários, como escritores e poetas, filósofos e pensadores, que
viveram num passado distante e que, enquanto encarnados, puderam fazer algumas
predições interessantes, que depois, de certa forma, se confirmaram.
Entretanto, essas previsões eram muito discretas e superficiais, como dissemos.
Elas só foram confirmadas quando os cientistas já podiam dispor de instrumentos
e condições para estudar e descobrir as leis naturais que regulam os fenômenos.
A Doutrina Espírita
esclarece que as revelações – sejam elas da ciência ou do Espiritismo – só acontecem
quando a humanidade atinge um determinado nível de desenvolvimento. Assim, ao
tempo de Jesus, por exemplo, não era possível descobrir a eletricidade e nem no
século de Kardec, inventar um aparelho como a televisão, pois nem rádio
existia. Cada coisa vem a seu tempo, assim como, no desenvolvimento do ser
humano, cada idade corresponde um nível de compreensão sobre a vida.
Aliás, Jesus já utilizava
este argumento, quando disse aos discípulos, conforme o Evangelho de João, que
ele não poderia revelar mais coisas, porque o povo não estava preparado para
compreender, mas que enviaria um Consolador, o Espírito da Verdade que, no
futuro, viria relembrar seus ensinamentos e revelar outras coisas ao homem.
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