Eu
vejo que a grande diferença entre os evangélicos, os católicos e os espíritas;
é que os espíritas não leem a Bíblia, leem apenas as obras de Kardec. Minha
pergunta é a seguinte: podemos confiar mais em Kardec do que na Bíblia?
(Anônimo)
Evidentemente, caro ouvinte, católicos e evangélicos não falam a mesma
língua do espírita, porque atuam apenas no campo exclusivo da fé. Desse modo, muitos
deles aceitam os textos bíblicos como verdade absoluta, enquanto que os
espíritas, por princípio, devem colocar a razão para controlar a fé, baseando-se
no princípio de que para crer é necessário compreender. Assim, o espírita não
costuma ler, nem mesmo as obras de Allan Kardec, apenas para aceitar passivamente
o que lá está escrito, sem examinar e sem questionar.
São duas
posturas diferentes ou formas diferentes de interpretar o que está escrito. Não
é que os espíritas não se interessam pela Bíblia; muito pelo contrário. A
questão está na maneira como eles interpretam seus textos Porque não basta ler,
no sentido de verbalizar o que lá está escrito, mas de verificar o que se pode
descobrir e concluir a respeito daquelas informações. Para tanto, é preciso
conhecer a cultura da época e o que podia significar cada regra ou cada
mandamento que a religião estabelecia.
Vamos dar um exemplo para você melhor
entender. Adão e Eva são tidos, na Bíblia,
como os primeiros seres humanos a habitar este planeta, como se aquele cenário
do paraíso tivesse sido uma realidade concreta. Para os espíritas, no entanto,
trata-se de um mito, ou de uma alegoria – que serviu para atender às
necessidades do homem da antiguidade, mas não mais atende ao homem de hoje, que
vive a era da ciência. Sabemos, todavia, que atrás dessa alegoria há uma grande
lição moral para a humanidade, mas não podemos confundir aquele relato com a
realidade.
Desse
modo, a Bíblia tem que ser muito bem estudada, para se saber como eram a
cultura, os costumes e os usos daquele tempo. Ela tem um conteúdo tão vasto
que, até hoje, dá margem a muitos entendimentos, fazendo com que surjam em
torno dela milhares de religiões, cada uma querendo a verdade para si. Desse
modo, o que você quiser, vai encontrar ali, conforme sua fé, suas crenças e
seus valores de vida. Por que? Porque se trata de relatos antigos de fatos mais
antigos ainda, que se deram num seio de um povo totalmente diferente do nosso.
Os espíritas, no entanto – aqueles que seguem
os princípios enunciados por Allan Kardec – interessam-se sobremaneira pelos
ensinamentos de Jesus e que estão nos evangelhos. Mas, mesmo os ensinamentos de Jesus precisam
de estudo e de reflexão, pois Jesus viveu numa época e num cenário bem diferentes
dos nossos, com um povo de idéias, concepções, problemas e dificuldades muito próprios
e dos quais ele participou. Muitos dos usos, dos costumes, dos valores, da forma
de encarar a vida, das leis de então não se adequam às condições de vida
atualidade.
É
claro que na Bíblia existem valores universais, idéias que servem para todos os
tempos e povos, como, por exemplo - não
matar, não roubar, amar o próximo; mas é o bom senso que leva o leitor a separar
o que é universal e o que é próprio de um momento e de um lugar. Por isso, o
leitor tem que ser um estudioso do texto bíblico, consultar a história,
conhecer as diversas épocas por que passaram aquele povo, compreender suas
necessidades e aspirações.
Só para
você ter uma idéia até onde chega essa discrepância de valores morais, cara
ouvinte, na lei mosaica, ouça estas: Deus mandava matar os inimigos de forma
cruel, não tolerava desobediência de seu povo, ordenava que se apedrejassem os
adúlteros e os homossexuais, também os filhos rebeldes e os que fossem
surpreendidos trabalhando aos sábados – isso, apenas para dar alguns poucos exemplos. É claro que essa lei não faz nenhum sentido
para nós, hoje; e nem fez para Jesus, que já quis mudar tudo isso há 2 mil
anos.
Logo a
Bíblia é uma das obras mais importantes para a humanidade, que revela muito da história e do pensamento religioso
de um povo respeitável, mas precisa ser compreendida de forma adequada, pois
não podemos trazer para o presente muita coisa que ficou no passado, muito
entendimento que atendiam a determinados momentos, e que nada mais tem a ver
com as necessidades e aspirações do homem da atualidade.
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