Pairava um clima de
expectativa e ansiedade naquele lar, na cidade de Itambé, a 500 quilômetros de
Salvador, na Bahia, para a qual a família havia se mudado meses antes,
procedentes de Piracicaba, São Paulo. Era sexta feira, 20 de junho de 1980, e,
as malas estavam prontas desde cedo para a viagem programada para aquele final de
semana, a fim de participarem, em cidade próxima, de tradicionais e conhecidas
festas de São João. A tarde, porém, permanecia agitada e, Dona Vilma,
ao fazer breve saída para comprar jenipapo para preparar um licor, guardou na
memória a imagem da filha de dezesseis anos, Cris, deitada no tapete
da sala, de bruços, ouvindo com uma amiga o último disco que havia comprado.
Rememorando detalhes do que ocorreu na sua ausência diz que “foi
num instante, de repente, tudo acabado. Não sabia como e nem por quê. Parecia
uma enorme loucura, uma terrível mentira, um doloroso pesadelo. Cristiane
morria em minhas mãos... e com ela, também, me sentia morrer”. O fato a
que se refere somente seria devidamente aclarado, cinco meses e nove dias
depois, através de uma carta que sua amada filha lhe escreveria através da
mediunidade de Chico Xavier, na cidade de Uberaba, Minas Gerais, em reunião
pública, entre outras recebidas. Era a terceira vez que ia ao encontro do
médium: na primeira, ele se encontrava viajando; na segunda, o conheceu,
encontrando a certeza e a esperança, ouvindo-o citar nomes impossíveis de serem
por ele conhecidos, o que a fez pensar: -“Se esse homem vê e sabe os nomes de meus
familiares, principalmente do meu bisavô, desencarnado há muitos anos, que nem
meu pai conheceu, por que também Cris não estará viva? Claro que sim. Cris
vive, meu Deus! Vive e esse homem pode vê-la!”. Para ela, surge então, “uma
nova visão da vida, uma nova visão da morte”. Do Plano Espiritual,
naquela ocasião, apenas um bilhete: -“Tão logo se nos faça possível,
cooperaremos na obtenção das notícias solicitadas. Confiemos no amparo de
Jesus, hoje e sempre”. Tal prognóstico se materializou na inesquecível
noite de 29 de novembro, com a recepção da primeira das 5 mensagens que seriam
escritas por de Cris. Iniciando suas notícias, Cristiane explica: -“A
querida vovó Olimpia me trouxe aqui para este encontro. Comunica-me que devo
explicações à querida família, o que tento articular nestas folhas escritas.
Sobretudo, é a tranquilidade ao seu carinho, ao meu pai, aos irmãos, ao
Paulinho e aos familiares que me cabe promover”. Mais à frente, do seu
ponto de vista, explica o que ninguém entendeu: -“O que sucedeu foi o inevitável.
Vendo-me com a Virna e conversando sobre as festas joaninas, repentinamente
lembrei-me de que pretendia guardar alguns enfeites no móvel em que estava a
arma do irmão. Sem a menor ideia de que o perigo nos cortejava, retirei-a, ou
melhor, procurei retirá-la cuidadosamente do lugar em que se mantinha. Inábil
qual me vi, não sei de que modo certa parte da arma tocou no móvel e o projétil
foi arremessado sobre mim. Arrasada de susto e ainda desconhecendo que
consequências poderiam sobrevir da ocorrência, estirei-me às pressas no leito
rente a nós e, sinceramente, não sei de que maneira larguei a arma ou deixei-a
em qualquer lugar, porque a intenção de acolher-me no leito foi meu propósito
dominante. Era inútil gritar por socorro, porque as forças não davam para isso.
Notava a aflição da companheira que não tivera participação alguma no episódio
infeliz, entretanto, nem mesmo dirigir-lhe a palavra estava em meus recursos,
porque a voz esmorecera na garganta e um abatimento estranho me dominou todas
as energias. Não sei se aquilo foi morrer ou dormir, desmaio ou repouso. A
única recordação que me ficou foi a certeza de minha impossibilidade para
qualquer reação”. Dirimindo dúvidas naturais diante da aparente
tranquilidade da outrora alegre, irrequieta e estudiosa Cristiane, vitimada por
tão brusca e violenta mudança, ela acrescenta: -“Não estou escrevendo sozinha
por que não conseguiria dispor de meios para me exprimir, com quem telegrafa.
Vovó Olimpia e aquele amigo que se me fez conhecido e estimado por Vovô
Lourenço, com outros amigos, nesta hora me amparam os pensamentos e a mão a fim
de que me expresse com a verdade e clareza”.Em outro momento, desabafa:
-“Saudades
são muitas, no entanto, a sede de paz em auxílio de nós todos é a nota
predominante dos sentimentos que me tomam o coração”.
Gostaria de saber se podemos dizer que o
Espiritismo é politicamente correto. (Roberto)
Depende do que se entende por “politicamente
correto”, Roberto. A expressão “politicamente correto” geralmente é usada para
se referir a um posicionamento sem preconceitos, declarações que evitam ofender
pessoas, grupos sociais ou étnicos, principalmente minorias. Logo, quando
alguém faz uma declaração nesses termos, procurando ser o mais assertivo
possível, demonstrando respeito pelos diferentes, dizemos que tem uma postura
politicamente correta.
Nesse sentido, podemos afirmar que o
Espiritismo – que, desde de sua origem, há 163 anos atrás, procurou ser o mais
assertivo possível, combatendo toda sorte de preconceito – pode ser visto como
uma doutrina “politicamente correta”. Trata-se, portanto, de uma postura
ético-moral, cujas bases estão nos ensinamentos de Jesus, conforme lemos nos
evangelhos. Todos sabemos que o que Jesus mais combateu no seu tempo foi o
preconceito, razão pela qual ele se colocou ao lado dos pobres, das mulheres e
dos discriminados em geral.
Como espíritas, nós não podemos ter a pretensão de ser os donos exclusivos da
verdade ou de nos apresentarmos como superiores a ninguém. Acreditamos que a
verdade não é uma dádiva que cai do céu de graça para beneficiar somente alguns
privilegiados, mas é uma conquista que a humanidade, como um todo – utilizando
de todos os diferentes - vai obtendo ao
longo do tempo. Se você consultar O LIVRO DOS ESPÍRITOS, origem da Doutrina
Espírita, vai perceber isso, mas vai encontrar também uma postura que não era
comum naquela época.
Direitos humanos é coisa nova, que só veio se
consolidar como política social depois da segunda guerra mundial. Discriminação,
preconceito, intolerância, perseguição – tudo isso já fez parte da História da
Humanidade e, infelizmente, até hoje existe. Trata-se, evidentemente, de uma manifestações
do orgulho e da intolerância, que enaltece alguns, como seres escolhidos e
privilegiados, e subestima outros como desprezíveis e condenados.
O verdadeiro espírita,
aquele que de fato conhece sua doutrina, não pode discriminar ninguém em nome
do Espiritismo, e muito menos condenar quem não concorda com suas idéias. Pelo
contrário: como o Espiritismo prega a liberdade, como um direito natural e
fundamental do ser humano, ele deve ser o primeiro a defender a liberdade de
pensamento e expressão, e defender o direito de manifestação até mesmo daqueles
que combatem sua doutrina.
Isso não quer dizer, absolutamente, que o
Espiritismo concorda com tudo ou que defende qualquer tipo de manifestação. O
Espiritismo não pode concordar com o desrespeito. Está muito claro n’O LIVRO
DOS ESPÍRITOS que todas as doutrinas são respeitáveis, mas que não poderia
merecer respeito a doutrina que conspira contra o bem-estar da coletividade,
incentivando a separação e o confronto, a intolerância e a perseguição. Além do
mais, como fez Jesus, a Doutrina Espírita não combate pessoas, combate idéias.
Nesse sentido, Roberto, é possível dizer que a
política adotada pelo Espiritismo é correta, ou procura sê-lo tanto quanto
possível, de acordo com o nível evolutivo da humanidade. Incorreta seria a
política que fomenta a discórdia entre os homens, que estimula a separação,
criando barreiras de comunicação entre as pessoas.
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