Obstinado perseguidor da Verdade, Professor Rivail, identificado pelos estudiosos do Espiritismo como Allan Kardec, não se intimidava diante de desafios que, naturalmente, foram muitos diante da diversidade de fenômenos e dúvidas derivadas deles que se multiplicava em várias partes da Europa na segunda metade do século 19. Uma das instigantes questões levantada pela lógica era: se realmente há Espírito a comandar o corpo físico durante o período da vida física, seria possível obter dele suas impressões e percepções como encarnado através da médium? O profícuo “laboratório” conhecido como Sociedade Espírita de Paris se servindo do incrível “instrumento” equivalente, segundo ele, ao microscópio chamado mediunidade precisava desenvolver experimentos nesse sentido. Assim foi feito como relatado no número de janeiro de 1860 da REVISTA ESPÍRITA, em duas reuniões sucessivas, a de 25 de novembro e 2 de dezembro de 1859. A carta de um Conde identificado apenas pelas iniciais R.C. de 23 de novembro motivou a experiência, visto que ele mesmo se oferecia como voluntário, considerando ter assistido na reunião de 14 de outubro passado a um experimento na própria Sociedade, em que um pai encarnado se comunicava com o Espírito da filha morta. Marcada a data para a incursão no desconhecido terreno, foi efetuada a primeira tentativa que obrigou a realização de outra, perfazendo, na entrevista com o Espírito desdobrado do Conde R.C., um total de 80 questões, quarenta e uma na primeira reunião, e, a outra, na segunda. D primeiro bloco de respostas, destacamos: 1- Tinha plena consciência de estar presente por ser evocado; 2- encontrava-se espacialmente entre o médium e Allan Kardec; 3- Não percebia tudo claramente pelo fato de seu corpo ainda não estar totalmente adormecido; 4- Que podia transportar-se instantaneamente e à vontade dali para sua residência e vice versa; 5- Podia ter consciência do trajeto percorrido, vendo os objetos do percurso; se o quisesse; 6- Seu estado diferia ao do sonâmbulo nos respectivo fenômeno a que este se entregava, pelo fato do sonâmbulo não dormir fisicamente, apenas ter suas faculdades orgânicas modificada, não entorpecidas; 7- Que evocado somente poderia indicar remédios se os conhecesse ou estando em contato com um Espírito que os conheça, o que não acontecia com os sonâmbulos; 8- As lembranças da existência corpórea estavam muito claras em sua memória; 9- Solicitado a descrever como se sentia, explicou estar no mais feliz e satisfatório estado que se possa experimentar, como num sonho em que o calor do leito que leva crer estar-se embalados no ar, ou na crista de ondas tépidas, sem preocupação com movimentos, sem consciência dos membros pesados e incômodos, a se moverem ou se arrastarem, sem qualquer necessidade a satisfazer, não sentindo o aguilhão da fome ou da sede; 10- Que tinha perfeita consciência de estar em Espírito ligado ao corpo por um laço, indescritível nas palavras conhecidas, mas, semelhante a uma luz fosforescente, que não lhe dava nenhuma sensação; 11- Tinha uma percepção maior dos sons que os percebidos pelos encarnados; 12- Transmitia seu pensamento ao médium, atuando sobre sua mão; para lhe dar uma direção, que facilitava por uma ação sobre o cérebro; que se servia ora das palavras que o médium tinha na cabeça e ora das suas; 13- Se encontrava no estado em que estará quando estiver morto, diferenciado pelo laço que o prende ao corpo; 14- Tinha lembranças confusas de vidas anteriores; 15- Poderia responder a uma pergunta mental. Do segundo conjunto, escolhemos: 1- Se seu corpo, desdobrado espiritualmente como estava, somente sentiria uma picada se fosse bastante forte; 2- Percebia odores mais intensamente que os encarnados; 3- Via perfeitamente na obscuridade, conseguindo enxergar através de corpos opacos; 4- Somente poderia deslocar-se a outro Planeta se este estivesse no mesmo grau da Terra, ou mais ou menos; 5- Via outros Espíritos no ambiente, constatando sua presença por sua forma própria, ou seja, pelo seu períspirito; 6- O períspirito é o corpo ou revestimento do Eu que é o Espírito, reproduzindo a forma do corpo material; 7- Seria como Espírito capaz de agredir fisicamente de forma perceptível um encarnado, só que em ambiente diferente do que estavam; 8- Se seu corpo morresse subitamente estando ele desdobrado, seria atraído para o corpo antes da consumação do fato, conseguindo se desligar dele com mais facilidade do que em circunstâncias comuns; 9- Tinha perfeito livre arbítrio sobre suas ações; 10- Uma recusa diante da possibilidade de ser útil aos semelhantes, tendo consciência de seus atos, resultaria em consequências inevitáveis; 11- Caso fosse ofendido por alguém estando desdobrado como se encontrava, o sentimento que emitiria seria o de desprezo, não procurando vingar-se; 12- Não tinha ideia da posição que ocupava na escala evolutiva dos Espíritos, não lhe sendo permitido disso ter conhecimento.
Nosso Cristiano, da cidade de Vera Cruz,
sempre estudando a Doutrina Espírita, volta ao programa para fazer a seguinte
solicitação: “ Peço comentários sobre o projeto Cartas de Kardec e sobre o
livro “Autonomia: a história jamais contada do Espiritismo” de Paulo Henrique
de Figueiredo.”
Prezado Cristiano, a notícia de que chegou à
FEAL – Fundação Espírita André Luiz uma expressiva quantidade de cartas inéditas
de Allan Kardec e a posterior publicação da obra AUTONOMIA, a História jamais
contada do Espiritismo, de Paulo Henrique de Figueiredo parece ter vindo em boa
hora trazer mais luz à história da doutrina. Para o público geral, não
familiarizado com o Espiritismo, podemos esclarecer o seguinte:
Até
então, o que sabíamos de Kardec e de sua obra dependeu de algumas biografias, a
primeira das quais de Henri Sausse, que viveu na sua época. Depois surgiram
outras e outras e, por último, tivemos a obra do jornalista Marcel Souto Maior,
que inspirou a realização do filme “Kardec”, exibido recentemente nos cinemas
brasileiros. Porém, as cartas em si não alteram praticamente o que já se sabia
de Allan Kardec. Elas apenas acrescentam algumas informações, que são úteis
para melhor compreensão da extensão e da profundidade de seu trabalho.
Tudo começou por intercessão de Canuto de
Abreu, empresário brasileiro e espírita que, no início do século XX, fez amplo
trabalho de pesquisa na França, conseguindo, por fim, a posse das referidas
cartas, até então desconhecidas. O que motivou sua investigação foi o fato de
perceber algumas distorções no entendimento da Federação Espírita Brasileira
quanto a determinados pontos da doutrina.
B - Na
época, Canuto de Abreu foi aconselhado por Emmanuel, Espírito orientador de
Chico Xavier, a não publicar as cartas de imediato, presumivelmente por causa
de problemas que poderiam dividir opiniões e criar mais cisões no movimento,
razão pela qual o empresário cuidou para que se preparasse seu neto para a
grande missão, o que veio a acontecer recentemente e que redundou nessa obra de
Paulo Henrique de Figueiredo.
A - As
cartas vieram valorizar ainda mais os trabalhos de Allan Kardec, mostrando
entre outras coisas, que ele respondeu a milhares de cartas recebidas do
público e das quais teve o cuidado de
guardar cópias na expectativa de que poderiam ser úteis no futuro, como
realmente estão sendo. Pelas cartas ficamos sabendo mais da sua luta e das
dificuldades que enfrentou para o desenvolvimento e a propagação da doutrina, comprometendo
sua vida pessoal e sua saúde. Elas demonstram sua seriedade, sua sensatez e
suas habilidades para lidar com tantos problemas, decorrentes do preconceito e
da intolerância contra os espíritas e contra o Espiritismo.
B – Em relação ao livro ‘AUTONOMIA, A
HISTORIA JAMAIS CONTADA DO ESPIRITISMO, Cristiano, estamos lendo com muita
atenção essa obra, onde pudermos constatar, pelo menos, três propósitos do
autor. Primeiramente de mostrar o panorama filosófico e científico do início
século XIX, quando os dogmas religiosos estavam sendo contestados pela ciência,
do que derivou o chamado Espíritualismo Racional que colocava razão e fé no
mesmo patamar. Figueiredo chama a atenção para a importância desses movimentos
que antecederam o surgimento da Doutrina Espírita.
A - Em
segundo lugar, após mostrar o trabalho de Kardec, o autor aponta para o que aconteceu ao Espiritismo depois de sua
desencarnação com a ingerência de pessoas que traíram a confiança do
codificador ( como ele próprio havia previsto), utilizando indevidamente dos
órgãos espíritas para introduzir ideias estranhas à doutrina e distorcer
conceitos originais. Além de mostrar essas distorções, que aconteceram na
França, ele também mostra suas repercussões no Brasil.
A – Por último, a autonomia moral que
caracterizam os princípios doutrina, que veio mostrar que cada um de nós foi, é ou será o juiz de seus
próprios atos, que o sofrimento humano não decorre de castigo divino; que na
Lei de Deus não existe um tribunal exterior para nos julgar, mas, pelo
contrário, cada um colhe o que semeou de acordo com o julgamento da própria
consciência que nada mais é que o cumprimento da lei de causa e efeito.