CAUSA E EFEITO. A grande preocupação do
momento, a COVID-19. Muitos questionamentos sobre o sentido espiritual da
pandemia, como este: “A COVID-19, doença causada pelo novo coronavirus, está
fazendo vítimas no mundo todo. Para boa parte das pessoas, o vírus não causará
maiores danos; nalgumas a doença não se manifestará, em outras ela causará um
pequeno dano que logo é curado, noutras ainda poderá exigir até uma internação
com alguns dias de sofrimento, mas numa minoria (entre elas as dos grupos de
risco), a doença levará as pessoas a óbito. A pergunta é: essas diferentes
condições que a infecção do vírus provocará estão no carma de cada pessoa? A
pessoa realmente deveria passar por isso?”
Abrindo O EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO, no capítulo 5, “Bem
aventurados os aflitos”, onde Allan Kardec esclarece, no item 4: “As vicissitudes da vida são de duas
espécies ou, se assim se quer, têm duas fontes bem diferentes que importa
distinguir: umas têm sua causa na vida presente, outras fora dela.” Depois disso, Kardec esclarece cada uma
dessas situações em dois itens: “Causas
Atuais das aflições” e “Causas
Anteriores das Aflições”.
Apesar de a questão estar
muito bem clara na obra de Kardec, há uma tendência, mesmo no meio espírita, de
se atribuir as aflições humanas somente a condutas de vidas passadas; esquecem
dos erros que estão sendo cometidos nesta vida, agora, neste momento Este é um
primeiro ponto sobre o qual chamamos atenção.
A palavra “carma” não é
espírita. Ela foi trazida do hinduísmo, mas quando utilizada no meio espírita
ela vem com essa conotação de expiação do passado. Kardec preferiu o termo expiação, embora o
termo “carma” já existisse. No Espiritismo temos os conceitos de expiação,
prova e missão.
Outro ponto é a confusão
que se faz entre expiação e prova, razão pela qual é comum se ouvir a respeito
de alguém, que está sofrendo muito, a seguinte observação: “É uma
prova que fulano está passando.”
Prova ou expiação? Geralmente não há a preocupação de se fazer essa
distinção. É o segundo ponto de nossa conversa de hoje.
Comecemos por provas e
expiações. As expiações são as consequências naturais de nossos erros, de
qualquer erro – grande ou pequeno, cometido nesta vida ou em outras, agora ou
anteriormente. Vamos utilizar a palavra “erro”, que é mais fácil para entender
como se se dá a resposta da natureza. Se você der uma forte martelada no dedo,
porque não tomou cuidado ou não soube manejar o martelo, com certeza, sentirá
dor imediatamente e provavelmente perderá a unha; e se você varar o ano letivo sem estudar, no
final do ano se surpreenderá com um resultado negativo de aproveitamento.
Essas duas situações
retratam o que é expiação: expiação é você sofrer as consequências de seus
erros e enganos. Não é Deus que castiga, é o efeito natural do que você fez. O
resultado pode ser imediato ou futuro, mas não vai deixar de aparecer.
Dependendo do erro cometido (muitas vezes a gente vem cometendo o mesmo erro
durante toda a vida), o resultado pode ser imediato, a médio ou a longo prazo.
Mas, uma coisa é certa, não é você que escolhe o resultado, cedo ou tarde ele
virá.
Nas provas, sim, é você que
decide. Por isso, as provas são situações difíceis e sofridas, a que o Espírito
se submete, reconhecendo suas necessidades e pensando em dar um impulso na sua
evolução. Logo, a prova é escolhida, demonstrando que o Espírito já tem
consciência de seus erros e se sente responsável por ele. Enquanto na expiação
o Espírito não aceita o revés e se revolta contra o sofrimento, na prova
geralmente ele o recebe com paciência e resignação, porque este é o estado
natural de quem tem certeza de que nada acontece por acaso.
Após tais distinções
podemos voltar à questão das vítimas da pandemia. De fato, após a pandemia,
teremos alguns resultados, mostrando que: 1º) uma grande parte não foi
contaminada pelo vírus; 2º) outra parte foi contaminada, mas a doença não se
manifestou; 3º) outra parte foi infectada, ficou doente, passou pelo tratamento,
e ficou curada; 4º) uma minoria morreu.
Considerando os princípios acima expostos, não seria correto
afirmar que todos os casos, mesmo dos que foram a óbito, dependeram única e exclusivamente de erros do passado, porque,
então, estaríamos ignorando as causas do presente.
Em Espiritismo não existe fatalidade
no sentido absoluto dessa palavra, até porque o Espírito é livre para
redirecionar seu destino a qualquer momento. É nisso que consiste o seu livre
arbítrio. Se a sua sorte estivesse determinada antes desta encarnação, com
certeza, nada que ele fizesse em contrário valeria a pena. Mas o livre arbítrio
existe justamente para dar ao Espírito a liberdade de escolher ou modificar o caminho que deseja trilhar.
A doença, tanto quanto a
morte – ou qualquer adversidade que surja na vida do Espírito – depende de
vários fatores: depende do que ele veio fazendo em encarnações anteriores e
depende do que ele está fazendo agora, na presente encarnação. Desse modo, o
fato de um indivíduo ser acometido da COVID 19 e morrer desta doença depende da
trajetória espiritual que veio fazendo, mas depende principalmente do que ele
está fazendo agora em termos de cuidados com a saúde. Assim, o individuo pode
vir a falecer, por negligência ou por abuso, porque não se preveniu, não fez o
que deveria ter feito para se livrar da doença.
Allan Kardec afirma que,
diante de uma aflição, devemos primeiro verificar se ela adveio de alguma falta
cometida nesta vida. Só no caso de não se verificar nenhuma causa presente (o
que é muito difícil). é que se pode
deduzir que se trata de uma expiação apenas do passado. Eis porque o próprio
Kardec, com relação à pandemia do Cólera, que aconteceu no seu tempo,
recomendou que todos adotassem as medidas de prevenção. Na edição de outubro de
1865 da REVISTA ESPÍRITA, em pleno surto de cólera, a pandemia da época,
respondendo a uma carta de um leitor de Constantinopla, Kardec deixou bem claro
a necessidade de todos seguirem as recomendações das autoridades sanitárias,
afim de prevenirem a doença que se espalhava.
É preciso considerar,
portanto, que o momento presente é sempre o mais importante de nossa vida, pois
é o único momento em que podemos agir e interferir na realidade à nossa volta.
O passado já foi e o futuro depende do presente. Os erros do passado devem
estar refletindo em nossa vida hoje, mas só hoje é que conseguimos atenuar ou
até mesmo anular seus efeitos, se soubermos agir com discernimento e vontade.
Eis a importância do livre arbítrio.
Sabemos, portanto, que nada acontece por acaso; que por alguma
razão estamos aqui neste momento, que muitos serão infectados pelo coronavirus
e que alguns poderão vir a óbito e retornando ao mundo espiritual. Contudo, as
causas que determinaram os sofrimentos individuais não são fáceis de se situar,
embora saibamos que, coletivamente, acometidos por essa pandemia todos, como
indivíduos e como coletividade, temos muito a aprender.
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