Quando Allan Kardec escreveu n’ O LIVRO DOS MÉDIUNS que a “mediunidade
é inerente ao homem, podendo dizer-se que todo mundo é, mais ou menos, médium”
e, que a “faculdade propriamente dita é orgânica”, ainda não se tinha no
Mundo Ocidental associado a mesma à glândula pineal ou epífise. Escolas
religiosas da Antiguidade, contudo, já dominavam tal conhecimento e o próprio
filósofo e matemático René Descartes a considerava a sede
da alma. Kardec foi além, escrevendo que “o médium fez pelo Mundo
Invisível o mesmo que o microscópio pelo mundo dos infinitamente pequenos”,
diante da quantidade espantosa de informações vertidas do Plano Espiritual
abrindo caminho para uma compreensão mais precisa sobre a razão de ser e
existir. O tempo foi consagrando o acerto de suas afirmações com os Espíritos
do Senhor fomentando o surgimento de inúmeras alternativas para o acesso das
criaturas humanas aos princípios da Verdade concernente à sua própria
imortalidade. Múltiplas formas de manifestação por sinal classificadas
previamente pelo erudito pesquisador foram despertando consciências ao redor do
Planeta em que vivemos. No Brasil, o caso Chico Xavier, especialmente, nas três
últimas décadas de sua tarefa, constitui-se em importante e segura fonte de
pesquisa. Sobre essa fase, afirmou que “como médium, essa tarefa das cartas de
consolação aos familiares em desespero na Terra foi o que sempre mais me
gratificou”, pois, “não existe sofrimento maior do que a dor de
perder um filho”. Acrescentou outra ocasião que “os Espíritos ainda não
encontraram uma palavra para definir a dor de um coração de mãe quando perde um
filho”. E esse conforto em grande parte deve-se à mediunidade que
interliga diferentes Dimensões existenciais. Prova disso é o trabalho do também
médium norte-americano James Van Praagh, autor do livro
autobiográfico CONVERSANDO COM OS
ESPÍRITOS (salamandra,1998). Convivendo com a paranormalidade desde a
infância sem que compreendesse bem suas percepções, já adulto acatou os
conselhos de outro sensitivo, buscou instrumentalizar-se de conhecimentos e
pôs-se a trabalhar para a Espiritualidade, oferecendo conforto e esperança para
pessoas que o procuraram na expectativa – apesar do ceticismo da maioria - de
obter algum tipo de informação sobre os porquês da dura separação nunca
cogitada nesse mundo em que o materialismo ofusca qualquer possibilidade de
atentar-se para outros aspectos da vida. James em seu livro generosamente
repassa sua visão pessoal dessa realidade, fundamentando-se não só nas
pesquisas que fez, mas também na experiência acumulada ao longo de vários anos
de trabalho e convivência com a dor alheia. Exemplificando suas opiniões com
casos atendidos, esclarece o pós-morte no caso de transições trágicas,
acidentes fatais, AIDS, suicídio, descrevendo o clima de intensa emoção quando
de reencontro dos que se amam. Apesar das diferenças culturais e o “modus
operandi” fundamentalmente diferente do observado através de Chico
Xavier, os resultados surtem o mesmo efeito: aplacam as dores da alma.
Pena que poucos médiuns se interessam por se dedicar e aperfeiçoar nessa linha
de trabalho. O próprio médium mineiro mostrou outro lado da questão em
comentário feito ainda quando encarnado sobre a questão dizendo: -“Não
entendo os nossos irmãos que combatem esse tipo de intercâmbio com o Mundo
Espiritual. Eles se esquecem de que os que partiram também desejam o contato. O
médium, sem dúvida, pode, em certas circunstancias rastrear o Espírito, mas, na
maioria das vezes, é o Espírito que vem ao médium. O trabalho da
Espiritualidade é intenso. Para que um filho desencarnado envie algumas
palavras de conforto aos seus pais na Terra, muitos Espíritos se mobilizam.
Isso não é uma evocação. Não raro são os próprios filhos desencarnados que
atraem os seus pais aos Centros Espíritas: desejam dizer que não morreram, que
continuam vivos na Outra Dimensão, que os amam e que haverão de amá-los sempre”.
Falando de si remetendo-nos a uma reflexão, Chico conclui: -“Oro
todos os dias pelas mães que perderam filhos, sobretudo em condições trágicas,
como um assassinato, por exemplo. Deus há de se compadecer de todas elas!...
Quando elas me procuram, é que verdadeiramente posso sentir a minha
insignificância para consolar alguém”... Os “doutores da lei” continuam
vigilantes e atuantes. Não percebem a importância da oferta desse serviço para
a comunidade nem o quanto seria útil para a propagação da mensagem da
imortalidade e das realidades que nos aguardam além dessa vida de onde a
qualquer momento sairemos para a necessária avaliação do nível de
aproveitamento da reencarnação provavelmente ansiosamente aguardada em algum
lugar do passado recente ou remoto.
Este fato foi relatado por um senhor que procurou
o Centro. Ele contou que, quando jovem, distratou de forma cruel um colega
diante dos amigos e, por mais que estes lhe pedissem que se desculpasse, ele,
cheio de si, recusou-se terminantemente a atendê-los. A partir de então, o
agressor e o agredido nunca mais se encontraram. Muitos anos se passaram, até
que um dia, já idoso, ao entrar num banco, o agressor se deparou com sua antiga
vítima, agora muito envelhecido e doente, amparado por um jovem, certamente um
cuidador. Imediatamente, a cena do passado lhe veio à memória e uma angústia
tomou conta de seu coração. Teve ímpeto de se aproximar, identificar-se e ajoelhar
a seus pés e pedir perdão, mas nada conseguiu fazer. Ele acha que nem foi
reconhecido. Dias depois, no entanto, levou um segundo choque ao saber que seu
antigo desafeto havia falecido e ele havia perdido a segunda chance de pedir
perdão. Desde então, passou a amargar no peito uma terrível sensação de culpa e
impotência.
Relatos como este só
vêm confirmar o quanto Jesus estava certo ao recomendar o perdão e o amor até
mesmo aos inimigos. É claro que o caso narrado por esse senhor não se dá com
todo mundo dessa mesma maneira, mas ele
revela, sem dúvida, que todos nós, independente de quem seja, estamos regidos
por uma lei universal que manda, acima de tudo, que pratiquemos o bem e
saibamos perdoar. Essa lei mora na consciência moral de cada um de nós.
Por mais nos afastemos
do mandamento maior, por maior estardalhaço que façamos na vida, procurando esquecê-lo
ou silenciá-lo, nunca conseguiremos nos desvincular de Deus, nunca apagaremos
de nossa consciência o dever de amar. Mais cedo ou mais tarde, no decorrer da
vida – seja desta vida, seja de outra que ainda está para acontecer – essa voz
interior, que aponta para o amor, falará aos nossos ouvidos, lembrando de
nossos deveres.
O orgulho e o egoísmo
com que atingimos os outros – tanto quanto o egoísmo e o orgulho com que outros
nos atingem - cedo ou tarde entrarão em
conflito com sua consciência moral, dizendo-lhe o que deveria ter feito e não
fez, ou o que não deveria ter feito e fez. Todos somos filhos de Deus, que é Amor, e é
imperioso que nos liguemos uns aos outros pelos laços do amor.
Por isso, Jesus
insistiu tanto no perdão, até no último momento de sua vida, lembrando que,
antes mesmo de pensarmos em adorar a Deus, devemos primeiro procurar o
adversário para se reconciliar com ele. Essa providência acontece pela
necessidade de resolvermos, o mais breve possível, nossas diferenças, pois, com
o passar do tempo, elas se tornam maiores e mais difíceis de serem aparadas.
Logo, a questão não é
apenas perdoar quem nos ofende, mas também pedir perdão para aqueles a quem
ofendemos. Caso contrário, como aconteceu com esse senhor, que trouxe seu
problema, prosseguiremos em conflito conosco mesmos, numa briga interior entre
a obrigação e a disposição para cumpri-la. Tanto quem perdoa, quanto quem precisa
de perdão, necessitam antes de tudo de humildade, o primeiro degrau para
adquirirmos todas as demais virtudes.