Na edição de outubro de 1864, Allan Kardec resume a pedidos de correspondentes da REVISTA ESPÍRITA a visita feita às cidades belgas de Bruxelas e Antuérpia para conhecer grupos espíritas daquela cidade. No interessante texto uma análise importante a respeito da necessidade da homogeneidade de pensamentos e sentimentos nas instituições organizadas em nome do Espiritismo descreve, por assim dizer, os efeitos comuns, especialmente quando tais Centros começam a se tornar muito grandes. Escreve ele: -“No começo de uma doutrina, sobretudo tão importante quanto o Espiritismo, é impossível que todos os que se declaram seus partidários lhe compreendam o alcance, a gravidade e as consequências. Deve-se, pois, esperar desvios da rota em pessoas que só lhe veem a superfície, ambições pessoais, aquelas para quem o Espiritismo é mais um meio que uma sincera convicção, sem falar de gente que toma todas as máscaras para se insinuar, visando a servir os interesses dos adversários; porque, assim como o hábito não faz o monge, o nome de espírita não faz o verdadeiro espírita. Mais cedo ou mais tarde esses espíritas fracassados, cujo orgulho ficou vivaz, causam nos grupos atritos penosos e suscitam entraves, dos quais sempre se triunfa com perseverança e firmeza. São provações para a fé dos espíritas sinceros. A homogeneidade e a comunhão de pensamentos e sentimentos são, para os grupos espíritas, como para quaisquer outras reuniões, a condição essencial de estabilidade e de vitalidade. É para tal objetivo que devem tender todos os esforços, e compreende-se que é tanto mais fácil atingi-lo quanto menos numerosas as reuniões. Nas grandes reuniões é quase impossível evitar a intromissão de elementos heterogêneos que, mais cedo ou mais tarde, aí semeiam a cizânia. Nas pequenas reuniões, onde todos se conhecem e se estimam, onde se está como em família, o recolhimento é maior, a intrusão dos mal-intencionados mais difícil. A diversidade dos elementos de que se compõem as grandes reuniões torna-as, por isso mesmo, mais vulneráveis à surda intriga dos adversários. É preferível, pois, que haja numa cidade cem grupos de dez a vinte adeptos, dos quais nenhum se arroga a supremacia sobre os outros, a uma sociedade única, que reunisse todos os partidários. Esse fracionamento em nada prejudicará a unidade dos princípios, desde que a bandeira seja única e todos marchem para o mesmo objetivo”. Como que exemplificando seus argumentos, Allan Kardec comenta uma das visitas feitas: -“Não esquecemos uma das mais honrosas menções ao grupo espírita de Douai, que visitamos de passagem, e um particular testemunho de gratidão pela acolhida que ali nos dispensaram. É um grupo familiar, onde a doutrina espírita evangélica é praticada em toda a sua pureza. Ali reinam a mais perfeita harmonia, a benevolência recíproca, a caridade em pensamentos, palavras e ações; ali se respira uma atmosfera de fraternidade patriarcal, isenta de eflúvios malfazejos, onde os Espíritos bons devem comprazer-se tanto quanto os homens; por isso, as comunicações retratam a influência desse meio simpático. Deve-se à sua homogeneidade e aos escrupulosos cuidados nas admissões, jamais haver sido perturbado por dissensões e desavenças por que os outros sofreram; é que todos os que dele fazem parte são espíritas de coração e nenhum procura fazer prevalecer a sua personalidade. Os médiuns aí são relativamente muito numerosos; todos se consideram como simples instrumentos da Providência, isentos de orgulho, sem pretensões pessoais, e se submetem humildemente e sem melindres ao julgamento sobre as comunicações que recebem, prontos a destruí-las se forem consideradas más”.
Gosto muito da Prece de Cáritas. Gostaria de saber quem é seu autor e se ela surgiu no Espiritismo ou já existia antes?
Cáritas é o nome dado por um espírito que se comunicava através de uma das destacadas médiuns do século XIX , conhecida por Madame W. Krell. Ela trabalhava num grupo da cidade de Bordéus, na França. Madame Krell foi uma das grandes psicógrafas da história do Espiritismo. Por ela vieram muitos textos em prosa e poesia, atribuídos a escritores e figuras proeminentes da História, como os escritores franceses, Lamartine, Alexandre Dumas, Pascal, André Chénier, Saint-Beuve e Alfred de Musset, e o inglês Edgard Allan Poe. Ela recebeu também O Espírito da Verdade, que dirigiu os trabalhos de Kardec, e autores antigos, como Esopo e Fénelon.
A Prece de Cáritas, hoje muito conhecida no Brasil, foi, portanto, trazida e difundida pelos espíritas. Curiosamente, essa prece foi psicografada numa noite de Natal, 25 de dezembro do ano de 1873, e ditada pelo Espírito de uma mulher, que se apresentou com o nome de Cáritas. Dela são, ainda, outras comunicações: "Como servir a religião espiritual"e "A esmola espiritual". Todas as mensagens que Madame Krell psicografada em transe, e, que chegaram até nós, encontram-se no livro, que em português, chamaria “Esplendores da Vida Espiritual”, publicado na França, em maio de 1875.
Acredita-se que Cáritas foi, no passado, a figura de Irene, martirizada em Roma no ano 305, quando das perseguições do Imperador Diocleciano. Canonizada pela Igreja, ela veio a ser conhecida como Santa Irene - ela e suas irmãs foram convertidas ao Cristianismo. Diocleciano determinou perseguição aos cristãos, e ela foi acusada de possuir "livros proibidos" e, por isso mesmo, foi condenada à fogueira, enquanto suas irmãs foram degoladas à sua frente.
Veja o que Cáritas, através da médium, Madame Krell, diz sobre a esmola: "A esmola, meus amigos, algumas vezes é útil, porque alivia os pobres. Mas é quase sempre humilhante tanto para quem dá, quanto para quem a recebe. A caridade, pelo contrário, liga o benfeitor e o beneficiário e, além disso, se disfarça de tantas maneiras! A caridade pode ser praticada mesmo entre colegas e amigos, sendo indulgentes uns para com os outros, perdoando-se mutuamente suas fraquezas, cuidando de não ferir o amor-próprio de ninguém."
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