O materialista ou o religioso convicto muda sua forma de pensar após a morte, vendo-se diante da continuidade da vida? Milhares de depoimentos de Espíritos que se serviram de médiuns para atestar sua sobrevivência provam que não. O tema, a propósito, foi abordado na reunião de 27 de março de 1863 da Sociedade Espírita de Paris, sendo incluída na seção Questões e Problemas do número de maio daquele ano da REVISTA ESPÍRITA. Motivou a abordagem, comentário de um participante sobre frase enunciada em reunião anterior que afirmava: -“Vossa prece comoveu muitos Espíritos levianos e incrédulos”. Diante disso indaga: -“Como podem os Espíritos ser incrédulos? O meio em que se acham não é a negação da incredulidade?”. Allan Kardec propôs aos Espíritos que quisessem comunicar-se tratar da questão, se julgassem conveniente, o que resultou em três manifestações. A primeira assinada por um Espírito de nome Viennois, dizendo, entre outras coisas, o seguinte: -“ No mundo em que habitais, acreditava-se geralmente que a morte vem de repente modificar as opiniões dos que partem e que a venda da incredulidade é violentamente arrancada aos que na Terra negavam Deus. Aí está o erro, porque para esses a punição começa justamente ficando na incerteza relativamente ao Senhor de todas as coisas e conservando a mesma dúvida da Terra. Não, crede-me. A vista obscurecida da inteligência humana não percebe a luz instantaneamente. (...). A passagem da Vida Terrena à Espiritual oferece, é certo, um período de confusão e de turbação para a maioria dos que desencarnam. (...). É fácil vos dardes conta dessa diferença examinando os hábitos dos viajantes que vão atravessar o Oceano. Para alguns a viagem é um prazer; para maior número um sofrimento vulgar, que durará até o desembarque. Então! É, por assim dizer, a viagem da Terra ao Mundo dos Espíritos. Alguns se desprendem rapidamente, sem sofrimento e sem perturbação, ao passo que outros são submetidos ao mal da travessia etérea. (...). Os incrédulos e os materialistas absolutos conservam sua opinião Além Túmulo, até o momento em que a razão ou a graça tiver despertado em seu coração o pensamento verdadeiro, ali escondido”. Baseando-se na resposta, Allan Kardec propõe uma reflexão sobre: -“Compreende-se a incredulidade em certos Espíritos. Mas não se compreenderia o materialismo, pois seu estado é um protesto contra o reino absoluto da matéria e o nada após a morte”. Pronuncia-se o Espírito Erasto pelo mesmo médium, Sr D’Ambel: -“Só uma palavra: todos os corpos sólidos ou fluídicos pertencem à substância material – isto está bem demonstrado. Ora, os que em vida só admitiam um princípio na natureza – a matéria – muitas vezes não percebem ainda após a morte, senão esse princípio único, absoluto. Se refletísseis sobre os pensamentos que os dominaram a vida, acharíeis que estavam certos, ainda hoje, sob o inteiro domínio dos mesmos pensamentos. Outrora se consideravam como corpos sólidos; hoje se olham como corpos fluídicos, eis tudo. Notai bem que eles se apercebem sob uma forma claramente circunscrita, embora vaporosa, mas idêntica à que tinham na Terra, em estado sólido ou humano. De tal sorte que não veem em seu novo estado senão uma transformação de seu Ser naquele em que não tinham pensado. Mas ficam convencidos que é um encaminhamento para o fim a que chegarão, quando estiverem suficientemente desprendidos, para se dissolverem no grande Todo Universal. Nada mais teimoso do que um sábio. E eles persistem a pensar que, nem por ser demorado, esse fim é menos inevitável. Uma das condições de sua cegueira moral é de os encerrar mais violentamente nos laços da materialidade e, consequentemente, de os impedir se afastem das regiões terrestres ou similares à Terra. E, assim, como a grande maioria dos desencarnados, aprisionados na carne, não podem perceber as formas vaporosas dos Espíritos que os cercam, também a opacidade do envoltório dos materialistas lhes veda a contemplação das entidades espirituais” (...). A terceira mensagem foi escrita pelo Espírito Lamennais, através do médium Sr Didier e, sobre seu conteúdo Allan Kardec observa: -“Desde que vemos Espíritos que, mesmo muito depois da morte, ainda se julgam vivos, vagam ou creem vagar nas ocupações terrenas; é que tem completa ilusão quanto à sua posição e não se dão conta do estado espiritual. Desde que não se julgam mortos, não seria de admirar que tivessem conservado a ideia do nada após a morte, que para eles ainda não veio”.
Por que nós não vemos os Espíritos? Se pudéssemos ver os Espíritos, com certeza, acreditaríamos neles e conheceríamos logo a verdade sobre tudo.
Sua conclusão parece lógica, cara ouvinte, mas não é assim que funcionam as leis da natureza. A descoberta da verdade é um caminho longo e tortuoso e é assim que a humanidade vem caminhando durante milênios. Isso porque somos Espíritos em evolução. Assim como a criança, que devagar vai adquirindo conhecimentos do mundo que a rodeia, nós com suas próprias experiências, como Espíritos, precisamos de maturidade para entender as coisas. Não somos perfeitos: a perfeição é uma busca constante, e ela se dá de acordo com a lei de evolução. Se você compulsar as obras que contam a história da humanidade, vai perceber que o homem sempre esteve à procura da verdade e que, ao longo do tempo, ele veio penetrando nela, muito devagar.
Há, pelo menos, três grandes campos de conhecimento, que viemos percorrendo. O campo da religião, que surgiu primeiro na vida humana, mas se deteve exclusivamente na busca da verdade pela fé; o campo da filosofia, que veio em seguida, e que foi buscar a verdade, baseando-se na razão, no raciocínio; e, finalmente, o campo da ciência, que tem por base a experimentação para descobrir as leis da natureza. Nenhum desses campos, todavia, é completo, ou seja –nenhum deles, até hoje, nos deu uma resposta pronta e cabal de toda a verdade – simplesmente porque a verdade é uma conquista que vamos obtendo, pouco a pouco, conforme o caminhar de nossa evolução.
Por milhares de anos, o homem acreditou que, de acordo com a Bíblia, a Terra era o centro do Universo, posição defendida com unhas e dentes pela religião, até que chegou um momento em que não mais foi possível calar a boca de alguns estudiosos que apresentavam outra verdade. O mesmo aconteceu com a maioria das outras questões fundamentais, pois os conhecimentos se renovam por meio de novas descobertas e essas descobertas custam muito trabalho e dedicação do ser humano. Até meados do século XIX, a ciência desconhecia por completo a existência do mundo invisível dos microorganismos ou micróbios. Louis Pasteur, um químico francês, quase foi linchado quando afirmou que existem micróbios no ar que respiramos, em nosso corpo e em tudo que pegamos.
Antigamente só se acreditava naquilo que era possível ver. O mundo material, para o homem, era somente o que ele podia perceber pelos sentidos. Depois do descobrimento das leis da eletricidade, do eletromagnetismo, dos microorganismos e dos intrigantes fenômenos quânticos (completamente invisíveis a olho nu), foi possível conceber que existem tipos de matéria ou energia, que não perceptíveis aos sentidos humanos. Entretanto, com relação ao mundo espiritual, o Espiritismo antecedeu a ciência e vem afirmando, desde o século XIX, a existência de outras dimensões da natureza, que escapam totalmente à capacidade comum de percepção.
Desde a antiguidade existiam pessoas que relatavam visões extraordinárias, inclusive de Espíritos – como vemos na Bíblia e em outros livros sagrados. Essas pessoas são dotadas de uma faculdade extraordinária de percepção que, de algum modo, podem captar sinais que estão fora do alcance dos sentidos comuns. A essas pessoas o Espiritismo chamou de médiuns. Entretanto, os médiuns, por mais extraordinária seja sua faculdade, só conseguem perceber algum lance isolado do que passa no mundo espiritual. Não percebem tudo. Na verdade, eles percebem muito pouco e nem sempre de forma clara e compreensível.
Desse modo, cara ouvinte, nós ainda estamos longe de conhecer o mundo que nos rodeia. O Espírito tem reduzida sua capacidade de percepção ao reencarnar por causa da limitação dos sentidos físicos. Mas, nem por isso, vamos continuar negando que só existe o que vemos. Seria recair no mesmo erro de nossos antepassados que, por desconhecimento, não conheceram muito do que podia existir no mundo. Além do mais, no nível evolutivo em que nos encontramos, o fato de não percebemos os Espíritos é uma necessidade para o exercício de nossa liberdade de ação e de podermos continuar buscando, estudando e aprendendo pelos nossos próprios esforços.
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