- “O Espírito no início de sua fase humana, estupido e bruto, sente a centelha divina em si, pois, adora um Deus, que materializa conforme sua materialidade”, escreveu Allan Kardec em uma de suas ponderadas análises contidas na edição de fevereiro de 1864 da REVISTA ESPÍRITA. Noutra oportunidade, comentou que “a vida humana é uma escola de aperfeiçoamento espiritual e uma série de provas. Por isso é que o Espírito deve conhecer todas as condições sociais e, em cada uma delas, aplicar-se em cumprir a vontade divina”. Nesse contexto, vão surgindo as religiões, organizações humanas que, apesar de resultarem quase sempre de revelações espirituais, institucionalizam tais pensamentos que geralmente se desvirtuam e desfiguram pela ambição dos receptores e administradores da nossa Dimensão. Num planeta como a Terra, classificado como de Expiação e Provas em mensagem mediúnica assinada pelo Espírito que nas convenções da escola religiosa que serviu é identificado como Santo Agostinho, considerando a condição evolutiva predominante, “a reencarnação determina sempre, procriação e alimentação, isto é, necessidades da matéria a satisfazer e, assim, entraves para o Espírito”, submetendo as individualidades a provas como “o poder e a riqueza, como a pobreza e a humildade”, que durante várias vidas sucessivas resultam em expiações conhecidas como dores, idiotismo, demência, etc, pelo mal cometido em vida anterior”. O sentimento e pensamento religioso, vai, portanto, refletindo sempre nossa condição evolutiva. Daí a sua persistência após a chegada ao Mundo Espiritual após a morte. No interessante trabalho intitulado CARTAS DE UMA MORTA (lake,1935),segundo livro com produções psicográficas de Chico Xavier, a entidade Maria João de Deus que, entre outras atividades desenvolvidas em nosso Plano foi mãe do médium em meio aos nove filhos a que deu a luz, revela que “são inúmeras as congregações de Espíritos mais apegados às ilusões da Terra que através de muitas organizações se dedicam à salvaguarda de seus ideais religiosos na primeira esfera existente no orbe terráqueo. A Igreja romana, por exemplo, tem aí conventos, irmandades, que defendem seus pontos de vista, e, assim de facção em facção, pode-se compreender a imensidade da luta dos trabalhadores da Verdade. Nas colônias de antigos remanescentes da África,” - conta ela – “vim conhecer costumes esquisitos, como bailados estranhos, ao som de músicas bizarras que me deram a impressão de fandangos, tão da preferência dos escravos no Brasil”. Décadas depois, em meio ao acervo constituído das milhares de cartas/mensagens psicografadas publicamente em reuniões na cidade de Uberaba (MG), perante público procedente de várias partes do País, ostentando diferentes níveis intelectuais, evidencia-se isso. Na assinada pelo jovem Roberto Muskat, filho de família ligada às tradições do Judaísmo, desencarnado aos 19 anos, pouco tempo após seu retorno ao Plano Espiritual, recordando suas primeiras impressões, relata ter participado no educandário-hospital em que convalescia de cerimonias cultivadas pelos seguidores de sua religião. Outro detalhe importante é que o abrigo se encontra em “Erets Israel, ou Terra do Renascimento, cuja beleza é indescritível”. Já Helio Ossamu Daikura, carinhosamente apelidado Tiaminho, integrante de família de Budistas, desencarnado em acidente de transito aos 5 anos, segundo o Espírito Bezerra de Menezes em bilhete psicografado aos pais, esteve “abrigado em Templo dirigido pelo Reverendo Sinnet, grande missionário do Bem, na revelação Budista”. Já a artista Clara Nunes, desencarnada trinta dias após se submeter a cirurgia considerada simples que lhe impôs o coma e a desencarnação por reação alérgica a anestésico a ela ministrado, relatou em carta psicografada à irmã ter acordado “num barco engalanado de flores, seguido de outras embarcações, nas quais muitos irmãos entoavam hinos que me eram estranhos. Hinos em que o amor por Iemanjá era a tônica de todas as palavras. Os amigos que me seguiam falavam de libertação e vitória. Muito pouco a pouco, me conscientizei e passei da euforia ao pranto da saudade, porque a memória despertava para a vida na retaguarda(...). Os barcos se abeiravam de certa praia encantadoramente enfeitada de verde nas plantas bravas que a guarneciam. Quando o barco que me conduzia ancorou suavemente, uma entidade de grande porte se dirigiu a mim, com paternal bondade, e me convidou a pisar na terra firme”. Como se vê, a natureza realmente não dá saltos. Diante disso, consegue-se entender a ponderação de Allan Kardec segundo a qual, “a facilidade com que certas pessoas aceitam as ideias espíritas; das quais, parece, tem intuição, indica que pertencem ao segundo período”, ou seja, aquele em que o Ser começa a se desprender das preocupações eminentemente sensórias e perseguir as conquistas intelectuais.
Cristiano de Vera Cruz nos traz mais uma questão inteligente, que consiste no seguinte: “ No livro O CÉU E O INFERNO, de Allan Kardec, cap. 7, Código Penal da Vida Futura, item 17, encontramos a seguinte frase: “A reparação consiste em fazer o bem àqueles a quem havia feito o mal. Quem não repara seus erros numa existência, por fraqueza ou má vontade, achar-se-á numa vida futura em contato com as MESMAS PESSOAS que de si tiveram queixas, em condições voluntariamente escolhidas, de modo a demonstrar-lhes reconhecimento e fazer-lhes tanto bem quanto o mal que lhes tenha feito. Pergunto: COMO QUE AQUELES, QUE FORAM RESPONSÁVEIS PELO ASSASSINATO DE JESUS REPARARAM ESSE MAL, SE NÃO HOUVE EXISTÊNCIA FUTURA DE JESUS PARA QUE HOUVESSE CONTATO ENTRE A VÍTIMA E SEUS ASSASSINOS?
Nesta, como em questão anterior, Cristiano, você trata de um Espírito muito especial, que é Jesus. Aliás, muito especial para nós – que ainda nos achamos muito distantes de seu nível evolutivo. A sua pergunta é oportuna porque nos leva a considerar a necessidade da reparação diante dos prejuízos que causamos uns aos outros. De fato, é o que Kardec diz nesse capítulo de O CÉU E O INFERNO, aliás uma leitura que todos devemos fazer para nos inteirar dos principais pontos do que consideramos um código divino.
Para o Espiritismo é primordial compreender como se dá a Justiça de Deus, conforme a máxima de Jesus que diz “a cada um segundo as suas obras”. Na verdade, tudo o que fazemos ou deixamos de fazer, começando pelos atos que nos pareçam mais insignificantes ou mesmo aqueles que sequer percebemos, tem um valor espiritual. Tem, portanto, um peso na justiça divina, principalmente quando se trata de prejuízos que causamos. Se na justiça humana existe essa preocupação, para que cada cidadão se conscientiza da importância de seu papel na sociedade, imagine como isso não é tratado pela justiça divina, que é perfeita.
Quando prejudico alguém, diante da Lei de Deus, contraio de imediato uma dívida para com essa pessoa. Essa dívida pode ser material ou moral, mas qualquer que seja o caso, a dívida moral é muito mais significativa do que a simples dívida material, porque ela se refere a quanto fiz a pessoa sofrer, ao quanto de medo, intranquilidade ou aflição lhe causei. Contudo, ao praticar esse ato, eu agredi a pessoa e agredi a lei de Deus, que está em minha consciência. Mesmo que essa vítima venha a me perdoar, mesmo que ela me compreenda a ignorância ou a maldade, mais cedo ou mais tarde, eu vou tomar consciência da dívida que contrai comigo mesmo, e vou me sentir culpado ou responsável pelo ato cometido, passando a sentir uma irresistível necessidade de me redimir.
Logo, Cristiano, eu fico devendo ou me sinto devedor diante dessa vítima e é para ela que tenho que pagar ou devolver o que tirei, em termos de esperança, de paz, de conforto, de proteção. Nesses casos, posso reencarnar para pagar essa dívida, seja por vontade ou não. Se não for por minha vontade, mas por uma contingência qualquer, será o que denominamos expiação. Mas se for por minha escolha , porque tenho necessidade de devolver o que tirei do outro, é o que chamamos de prova ou provação. Isso, porém, é regra geral, é o que geralmente acontece, embora cada caso deva ser particularizado ou analisado segundo suas peculiaridades.
Entretanto, Cristiano, você levanta o caso de Jesus, e pergunta como os seus inimigos e carrascos – depois de tudo que lhe fizeram – vão voltar para devolver a Jesus o que dele tiraram, uma vez que Jesus nunca mais encarnou na Terra e talvez nunca volte a reencarnar entre nós? Sua colocação é interessante. Contudo, trata-se de um caso muito peculiar, que precisa ser analisado em seus fundamentos.
Em primeiro lugar, precisamos considerar que Jesus perdoou incondicionalmente seus agressores e ele mesmo deixou bem claro esse sentimento, ao dizer: “Perdoa-lhes, Pai, porque eles não sabem o que fazem.” Ora, Jesus, nesse ato, dispensou qualquer tipo de pagamento, devolução ou reparação diretamente a si mesmo. Com isso, Jesus que amava os inimigos, quis dizer aos seus agressores: “Ora, vocês não me devem nada. Esqueçam. Agora o problema, que vocês passarão a ter não será comigo, mas com as suas consciências. E nisso vocês vão precisar do perdão de Deus”. Jesus estava se referindo aqui ao auto perdão, tema que podemos comentar noutro momento.
Quando a consciência do culpado desperta como uma explosão, Cristiano – e isso acontece com todos nós, mais cedo ou mais tarde em relação ao mal que fizemos – é que ele ( o culpado) começa a enfrentar o grande problema do remorso. É o fogo da culpa ardendo nos recessos mais profundos de sua alma. É quando ele passa a reconhecer e a avaliar a extensão do prejuízo que causou e, no caso específico de Jesus, que eles causaram à humanidade, porque Jesus viveu em função do bem de toda a humanidade, inclusive deles mesmos.
Logo, Cristiano, não há o que pagarem a Jesus, porque simplesmente Jesus os perdoou, mas há muito o que responder diante de suas consciências culpadas que, com certeza, lhes exigirão algum tipo de reparação, muito provavelmente em favor da causa pela qual Jesus viveu e morreu. Logo, acreditamos que os Espíritos que estiveram envolvidos diretamente na morte e no martírio de Jesus voltaram ou ainda voltarão à Terra para trabalhar em favor da disseminação da causa do evangelho. A fim se conquistarem a paz intima e a harmonia com as leis da vida, eles devem passar por situações difíceis, que lhes exijam esforço e sacrifício com que um dia se sentirão quites consigo mesmos, porque estarão atuando pela mesma causa de Jesus.
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