Autodidata, tinha 11 anos de idade quando, em Paris, Allan Kardec recebeu a encomenda dos primeiros exemplares impressos d’ O LIVRO DOS ESPÍRITOS. Residente em Tours, cidade a pouco mais de trezentos quilômetros da capital francesa, encontrou-se com a consoladora Doutrina, aos 18, conhecendo seu Codificador, aos 21, quando da visita do mesmo à cidade em que residia para proferir palestra para a qual foi convidado, em 1867. Viveria até os 81 anos, sendo que desde vinte anos antes, praticamente ficou cego, tendo sido secretariado no trabalho de seus escritos nessa fase, por uma admiradora chamada Claire Baumart, cuja convivência permitiu escrever o livro LÉON DENIS NA INTIMIDADE (clarim). Dentre os três grandes personagens da primeira hora do Espiritismo - o engenheiro Gabriel Dellane, o astrônomo Camille Flammarion -, ele, Léon Denis, preparado pela rudeza da própria vida na luta pela sobrevivência, certamente é o que melhor desenvolveu o aspecto filosófico da Doutrina. A leitura de seus livros transporta os que perpassam suas páginas para níveis vibratórios superiores. Quem leu O PROBLEMA DO SER, DO DESTINO E DA DOR, entende o que dizemos. Para demonstrar essas conjecturas, apreciemos um trecho do texto d’ O PORQUÊ DA VIDA: “O homem deve antes de tudo aprender a se conhecer a fim de clarear seu porvir. Para caminhar com passo firme, precisa saber para onde vai. É conformando seus atos com as leis superiores que o homem trabalhará eficazmente para a própria melhoria e do meio social. O importante é discernir essas leis, determinar os deveres que elas nos impõem, prever as consequências de suas ações. O dia em que estiver compenetrado da grandeza de sua função, o Ser humano poderá melhor se desapegar daquilo que o diminui e rebaixa; poderá se governar com sabedoria, preparar por seus esforços a união fecunda dos homens em uma grande família de irmãos. Mas estamos longe desse estado de coisas. Ainda que a Humanidade avance na via do progresso, pode-se dizer, entretanto, que a imensa maioria de seus membros caminha pela via comum, em meio à noite escura, ignorante de si mesma, nada compreendendo do propósito real da existência. Espessas trevas obscurecem a razão humana. (...) Por que é assim? Por que o homem desce fraco e desarmado na grande arena onde trava sem trégua, sem descanso, a eterna e gigantesca batalha? É porque este Globo, a Terra, está em um degrau inferior na escala dos mundos. Aqui residem em sua maior parte espíritos infantis, isto é, almas nascidas há pouco tempo para a razão. A matéria reina soberana em nosso mundo. Nos curva sob seu jugo, limita nossas faculdades, estanca nossos impulsos para o bem e nossas aspirações para o ideal. Além disso, para discernir o porquê da vida, para entrever a Lei Suprema que rege as almas e os mundos, é preciso saber se libertar dessas pesadas influências, desapegar-se das preocupações de ordem material, de todas essas coisas passageiras e cambiantes que encobrem nosso Espírito e que obscurecem nossos julgamentos. É nos elevando pelo pensamento acima dos horizontes da vida, fazendo abstração do tempo e do lugar, pairando, de alguma forma, acima dos detalhes da existência, que perceberemos a Verdade”.
Diante do que vocês vem falando sobre adoração, eu pergunto: adorar a Deus não é uma necessidade? A adoração não torna o homem mais humilde, mais obediente e, portanto, mais cumpridor de seus deveres para com o próximo e para com Deus?
Conta o Evangelho de João que, certo dia, Jesus se aproximou de uma mulher samaritana e passou a conversar com ela, inclusive falaram sobre o lugar ideal para se adorar a Deus: se no Templo de Jerusalém, como faziam os judeus, ou no Monte Garizim, como entendiam os samaritanos. Jesus, piorem, lhe disse, que chegaria o tempo em que o Pai seria adorado em Espírito e Verdade.
Adorar tem o sentido de prestar homenagem, cultuar, reverenciar, etc. A adoração em si, como tudo na vida, não é boa nem é má: ela depende do sentimento de quem a presta. Jesus falou sobre isso. Quando a adoração nasce de um sentimento puro, de intenções elevadas, com certeza, ela é boa e útil; mas quando é apenas uma dissimulação, uma forma de encobrir segundas intenções ou de aparecer diante dos outros, ou, ainda, quando é uma expressão de puro egoísmo, ela pode ser até mesmo nociva, prejudicial.
Em todas as épocas e em todos os povos, em todas as formas de manifestação religiosa que o mundo conheceu, sempre houve adoração. No passado remoto da humanidade, a adoração tinha outras características, de acordo com a cultura e as concepções de cada povo. Com o passar dos séculos, a adoração foi se amoldando às novas idéias e às novas aspirações da humanidade, de acordo com a lei de evolução. No tempo de Jesus, os judeus celebravam seus cultos no Templo de Jerusalém, os samaritanos no Monte Garizin.
Jesus,
porém, entendia que a verdadeira adoração se faz em Espírito e
Verdade, ou seja, não é a prática exterior de que as pessoas
de valem para demonstrar a sua fé. A prática exterior deve ser
apenas a manifestação do verdadeiro sentimento das pessoas. Jesus
entendia que fazer a vontade de Deus é, acima de tudo, praticar o
bem, porque nossos atos revelam nossos sentimentos. Essa é a
verdadeira adoração, porque também é a mais difícil. Ela se
constitui no verdadeiro sacrifício.
No passado, sacrificavam-se os animais e, em alguns momentos, chegou-se a sacrificar até mesmo seres humanos, pois o homem acreditava que Deus se mostrava tanto mais reconhecido quanto maior fosse o sacrifício que se lhe oferecesse. Jesus veio abolir todas essas espécies de sacrifício de vidas, para demonstrar que o mais elevado é o sacrifício de nosso egoísmo, de nosso orgulho, e de tudo aquilo que prejudica o próximo, além de nos prejudicar a nós mesmos.
Não é difícil perceber essa mensagem nos evangelhos. Ela está muito clara para quem quiser ver. Tanto assim que Jesus criticou os fariseus – que eram os mais exímios adoradores – e, sempre que teve oportunidade, exaltou o samaritano, considerado herege pelos judeus. Ele colocou o amor acima de tudo, acima das próprias religiões, como uma virtude divina, que devemos aprender a cultivar no dia-a-dia de nossa vida, fazendo aos outros o que queremos que eles nos façam e não lhes fazendo o que não queremos que nos façam.
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